Martin Scorsese e Robert De Niro mostram que juntos são os novaiorquinos mais geniais de todos os tempos!
Nota: DEZ
Título Original: Taxi Driver
Direção: Martin Scorsese
Elenco: Robert De Niro, Cybill Shepherd, Jodie Foster, Peter Boyle,
Harvey Keitel, Leonard Harris, Albert Broks, Martin Scorsese, Victor Argo,
Steven Prince
Produção: Phillip M. Goldfarb, Julia Phillips e Michael Phillips
Roteiro: Paul Sharader
Ano: 1976
Duração: 113 min.
Gênero: Drama / Thriller
Tavis Bickle é um homem como qualquer
outro que vive na terrível Nova York dos anos 1970. O maior problema de Travis,
entretanto, é que já não consegue mais dormir, dessa forma, o rapaz, de 26 anos,
alegando que já esteve no Corpo de Fuzileiros Navais, torna-se taxista no turno
da madrugada. Nesse contexto, Travis perambula pelas ruas da “cidade que nunca
dorme” e torna-se obcecado por duas jovens: uma prostituta de 12 anos, Iris, e
uma bela mulher que trabalha em comitê eleitoral, Betsy. Porém, o que não se
pode imaginar, é que essas obsessões farão Travis cometer insanidades,
inclusive estar disposto a matar.
“Taxi Driver” é considerado, por muitos
críticos, o maior filme da carreira do diretor Martin Scorsese. Para mim, é,
sem dúvida, o mais complexo e reflexivo. Tal complexidade e reflexão já começam
no início do longa: a abertura apresentada com a música de Bernard Herrmann ao
fundo é algo inexplicável e maravilhoso, ainda mais para quem já assistiu ao
clássico “Psicose”, com trilha sonora de Herrmann. Após isso vemos, as
perturbações inicias de Travis, como seu passatempo de ir assistir a filmes
pornográficos durante a madrugada em cinemas imundos e a desorganização de seu
apartamento que parece ser em uma zona bem pobre da cidade. Se pensarmos um
pouco, é rápido perceber como a vida do protagonista é ruim e como ele está
alienado para dezenas de acontecimentos a sua volta. Com o passar do longa, a
obsessão para com Betsy e com Iris nos trazem muitas verdades: Travis está
apaixonado por elas? Travis sente atração sexual por elas? Travis sente alguma
afeição profunda por alguma das jovens? O protagonista precisa ser cuidado e
cuidar de alguém? Travis está se sentindo sozinho e quer companhia? Na minha
opinião, Travis encontra em Iris e Betsy alguém por quem vale a penas lutar e
viver, enquanto Betsy tem sua vida chata trabalhando todos os dias e tendo que
dar foras diários em um colega insistente, Iris está subordinada a Sport, o
cafetão que manda nas prostituas da região onde Iris trabalha, e Travis sente
que pode ser o herói dessas duas mulheres. Além disso, da mesma forma que Iris
está ligada e deve obedecer Sport, Betsy está ligada ao Senador Palantine, e,
provavelmente, Travis se enche de ciúmes de ambos. Por fim, não se pode deixar
de falar, a respeito da construção de Travis, um dos personagens mais
enigmáticos e bem compostos da história do cinema, da forma como ele vê o mundo
e como se porta diante de tudo. Como já disse, temos a passatempo básico, que
já o caracteriza como um homem oprimido que não parece ter uma vida sexual
muito regrada, a vida social do protagonista gira, durante o longa todo, em
torno dos rapazes com quem trabalha na companhia de táxi, o que demonstra que
anteriormente ao trabalho na tal garagem, Travis não tinha nenhum amigo – até
por que, em momento algum faz-se referência a alguma relação mais estreita por
parte do personagem. Nova York, para Travis, é um lugar sujo, um lugar onde
toda a escória do planeta resolveu habitar e parece que veio sem pretensão
alguma de sair dali. Em uma das cenas mais antológicas do cinema moderno – onde
vemos Travis dirigindo pelas ruas de Nova York e refletindo o quanto aquela
cidade está suja e como uma limpeza é necessária para que tudo fique melhor –
vemos, claramente, como o rapaz está enojado por viver ali, como tem certos
preconceitos e como e vida suburbana é um verdadeiro lixo.
Martin Scorsese é um dos diretores mais
renomados da Sétima Arte e um dos mais ativos no momento. Em 1973, “Caminhos
Perigosos”, com De Niro, foi seu primeiro filme de sucesso a ser lançado no
cinema, mas foi 1974 o ano decisivo para o diretor e o ano que lhe rendeu um
posto entre os maiores diretores da década de 1970 – aquela geração “sexo,
drogas e rock’nroll” que salvou o cinema da mesmice e trouxe uma nova forma de
se ver o mundo e de se filmar, dentre eles ainda estavam George Lucas, Fancis
Ford Coppola, Steven Spielberg, Stanley Kubrick, Brian de Palma, entre outros.
Foi nesse ano que Scorsese provou seu talento nato ao lançar “Alice Não Mora
Mais Aqui”, com Ellen Burstyn, e “Taxi Driver”. “Taxi Driver” não foi apenas
mais um filme ao lado de seu grande parceiro Robert De Niro, foi o longa que
lhe deu a passagem garantida para realizar qualquer produção no cinema, teve 4
indicações ao Oscar, foi indicado no Sindicato dos Diretores da América, no
Globo de Ouro e no Sindicato dos Roteiristas da América, levando prêmios como o
dos Críticos de Nova York, da Associação Nacional dos Críticos de Filmes dos
Estados Unidos e destacou-se no Festival de Cannes, rendendo a Scorsese o Palma
de Ouro. Não é para menos, ninguém, jamais havia delatado de forma tão crítica
e debochada os problemas de Nova York, ou exaltado a cultura da época. Aliás,
se me perguntassem palavras chave a respeito desse longa, as primeiras que
diria, seriam Nova York e crítica e sátira social. O diretor faz inúmeras
referências a cenas clássicas e clichês de Hollywood, e ainda nos traz cenas
que seriam copiadas para sempre, sendo original e fantástico. A forma obscura
com a qual foram gravadas as cenas de Travis trabalhando na madrugada, no
prédio onde as prostituas trabalham e nos cinemas pornôs se contrasta com as
cenas de Travis se encontrando com Betsy e na tentativa de assassinato de
Palantine. Concluindo, nada poderia ser mais bem vindo nesse longa que a trilha
sonora impecável de Herrmann, um dos compositores mais controversos e
admiráveis do cinema, suas músicas são propícias e nada pode lembrar mais o
subúrbio de Nova York que elas. Herrmann foi indicado ao Oscar e ao Grammy pelo
trabalho.
Poucas coisas são mais agradáveis na
vida para mim do que assistir a um ator ou atriz veterano em algum filme do
início de sua carreira. Aqui temos dois casos desses. Primeiramente, o
protagonista Travis, que é interpretado com maestria por Robert De Niro, em uma
atuação que eu costumo chamar de assombrosa por ser tão perfeita e inigualável.
Para começar, a forma como De Niro muda fisicamente durante o longa é algo
maravilhoso e feito de forma competente por pouquíssimos atores. Mas a mudança
física do ator está longe de ser o melhor de sua interpretação: De Niro demonstra
os problemas e anseios do protagonista em cada feição, cada gesto e trejeito e
até mesmo na hora de falar. Aquela ironia e crítica que citei anteriormente são
vistas no personagem pela forma com a qual o ator fala, sorri e por suas frases
clássicas, dentre elas mais uma cena inesquecível, na qual o personagem,
olhando-se no espelho, indaga: “Você está falando... comigo?”, claro que a
forma de De Niro é mais convincente e divertida do que poderia explicar apenas
com esse texto. Finalmente, a forma de andar, de falar, de sorrir e de se
portar diante de tudo mostra o quanto Travis está infeliz e como morar em Nova
York é um suplício, isso, por que, de forma, mais uma vez, perfeita, De Niro
consegue trazer as aflições de um jovem de 26 anos que deseja fazer algo
realmente interessante pela humanidade, nos presenteando com mais uma cena
maravilhosa. Ao lado de De Niro está Jodie Foster, no papel de Iris, uma menina
que fugiu de casa por já não aguentar mais viver com os pais, mas que acaba
vendo que nem mesmo sua paixão por Sport a fará continuar com sua vida para
sempre. Foster iniciou sua carreira aos sete anos de idade, aqui, com 12, mesmo
aparecendo poucas vezes no longa – é necessário dizer que sua personagem é
essencial para o desenrolar da trama -, foi indicada ao Oscar melhor atriz
coadjuvante. Cybil Shepherd, a Jacy Farrow do clássico “A Última Sessão de
Cinema” (1971), vive Betsy, uma jovem ambiciosa que sabe a beleza que tem.
Shepherd está ótima no papel, começando por sua beleza inquestionável e pela
forma doce com a qual se porta durante todo o longa, atribuindo decência e
classe, que se contrapõe com o perfil de prostituta de Iris e com toda a
sujeira de Nova York. Não há como não citar, rapidamente, a grande aparição de
Martin Scorsese no filme, que vai além de apenas um vulto na multidão, ele é um
homem que acha que está sendo traído pela esposa com um homem negro, ser traído
já é triste, nesse contexto, ser traído com um homem negro é a pior coisa que
pode acontecer a alguém, e é bem isso que Scorsese deixa claro com um
personagem perturbado e completamente louco.
O desfecho de “Taxi Driver” é uma das
maiores incógnitas dos filmes da época. Não sabemos se Travis está sonhando, se
está tendo alguma espécie de visão do futuro, se é o que ele deseja que
aconteça que está acontecendo, se é realidade, se é pura ficção, se Travis enlouqueceu
de vez, se o protagonista está morto ou vivo. Na realidade, é difícil dizer o
que é totalmente real nesse filme e o que é pura ficção, pura imaginação da
cabeça perturbada de Travis, e nisso incluo o personagem de Scorsese. Para se
ter uma idéia do quanto isso tudo enlouqueceu o público e como esse filme foi marcante
para a sociedade da época, foi provado que John Hincley, homem que tentou
assassinar o presidente Ronald Reagan, estava motivado por duas coisas: uma
paixão doentia pela atriz Jodie Foster – foi comprovado que Hincley sofria de
erotomania, ou Síndrome de Clérambault – e pelo filme “Taxi Driver”, decidindo
que estaria a altura de Foster caso fosse uma figura conhecida nacionalmente,
e, para isso, deveria matar um presidente. Assassinar Palantine, tendo em vista
que Betsy passara a desprezar Travis, significava ficar famoso e estar a altura
de Betsy. O que não se podia esperar era que Travis faria tudo errado e, de
alguma forma, conseguiria fazer tudo como planejado para ficar famoso e se
tornar um heroi. No desfecho, portanto, parece que Travis já não se importa
mais com Betsy e que tudo acabou bem, que ele não precisa mais da moça e está
pronto para seguir em frente. Ou não, afinal, podemos verificar o mais importante
do longa em todo seu desenrolar: Travis é um homem bom, o problema é a
sociedade em que vive, que o corrompe a cada instante, ditando regras e fazendo
com que o jovem reprimido deseje ser alguém importante e conhecido. Não seria
muito mais fácil e correto simplesmente continuar seguindo nossas vidas sem
tais influências insuportáveis?
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