segunda-feira, 28 de outubro de 2013

062. O QUE TERIA ACONTECIDO COM BABY JANE?, de Robert Aldrich

Bette Davis e Joan Crawford nos apresentam um dos maiores duelos cinematográficos da história do cinema!
Nota: 9,5


Título Original: What Ever Happened to Baby Jane
Direção: Robert Aldrich
Elenco: Bette Davis, Jan Crawford, Victor Buono, Wesley Addy, Anne barton, Anna Lee, Maidie Norman, Bert Freed, Robert Cornthwaite, Julie Allred
Produção: Albert Aldrich e Kenneth Hyman
Roteiro: Lukas Heller e Henry Farrell (romance)
Ano: 1962
Duração: 134 min.
Gênero: Drama / Suspense / Thriller

Baby Jane Hudson era uma pequena americana loirinha que cantava e dançava em apresentações ministradas pelo pai. Enquanto isso, sua irmã Blanche era humilhada e assistia ao sucesso de Jane nos bastidores. Todavia, após alguns anos, Jane e Blanche cresceram e foi Blanche quem se tornou uma atriz famosa e respeitada, carregando Jane como prova de que era melhor que a irmã, inclusive espiritualmente. Certa noite, após uma festa, um acidente deixa Blanche paraplégica, e a culpa de tal acidente recai toda sobre Jane.


O longa nos apresenta uma breve contextualização a respeito dos acontecimentos nas vidas das irmãs Hudson, depois já vemos a duas mais velhas: Blanche velha, paraplégica e assistindo a um de seus filmes pela televisão, e Jane uma velha recalcada que passa os dias atormentando a vida da irmã. Enquanto Blanche relembra o passado glorioso com felicidade e sabe que pessoas ainda assistem ao seus filmes e a dmiram, Jane dança e canta algumas das músicas que apresentava com seu pai como uma pobre louca. Quando Robert Aldrich resolveu realizar esse filme, não havia uma alma em Hollywood que acreditasse no trabalho, afinal, duas velhas ultrapassadas fazendo um filme sobre duas atrizes fracassadas e esquecidas pela maior parte do mundo não era o ideal de produção da época. Porém, o filme foi um grande sucesso, chegando a ser indicado a 4 prêmios Oscar (incluindo melhor atriz para Davis) e vencendo em mais uma categoria, 2 indicações ao BAFTA e 2 ao Globo de Ouro. O longa em si não possui muitas grandiosidades, até por que não possui grandes efeitos ou algo do gênero, mas é um filme perturbador que se preocupa com cada detalhe em tornar tudo algo mais debochado ou assustador, desde a trilha sonora que pode parecer ridícula em alguns momentos, até os closes desesperadores de Blanche ou os closes malucos de Jane. Mas o mais importante está em como o roteiro nos traz a crítica de como se torna a vida de pessoas que um dia foram famosas e acabam sendo esquecidas (como aconteceu com Jane), ou são deixadas de lado pelas grandes produtoras (como aconteceu com Blanche). E mais: a vida decadente de duas ex estrelas que vivem em uma mansão imensa sozinhas, tendo que aturar uma a outra de forma terrível.


Foi “Baby Jane” que trouxe um novo tipo de filme para o gênero de suspense: o “psycho-biddy”, que consiste em um tipo de longa onde atrizes mais velhas fazem papeis protagonistas de mulheres velhas. Depois desse, mais de uma dezena de “psycho-biddy” foram lançados, e não há como contestar: Bette Davis e Joan Crawford foram as precursoras e as grandes protagonistas no gênero. Davis, por exemplo, ainda viria a protagonizar “Com a Maldade na Alma” (1964), “Nas Garras do Ódio” (1965) e “O Aniversário” (1968), que é, também, uma ótima comédia negra; Crawford, por sua vez, nos presentearia com “Almas Mortas” (1964), “Eu Vi que Foi Você” (1965) e “Espetáculo de Sangue” (1967). Tal “sub-gênero” de filme surgiu, especialmente, para dar lugar às atrizes mais velhas que desejavam chamar a atenção para lembrar que ainda estavam vivas, que ainda eram capazes de atuar e que não deixariam o cinema tão cedo. Tal prática tem funcionado até hoje: basta atrizes mais velhas se dedicarem a um papel de alguma mulher mais velha mais louca ou uma pessoa com um essência um pouco mais ruim e fria e pronto, Hollywood as abraça novamente. Foi isso o que aconteceu a Judi Dench em 2006 com o excelente “Notas Sobre um Escândalo” e, me atrevo a dizer, o que aconteceu também a Meryl Streep com a comédia sem sal “O Diabo Veste Prada”, onde Streep viveu uma mulher fria que não deixa os outros esquecerem quem está no poder (não tem absolutamente nada a ver com os thrillers abtuais aos quais o “psycho-biddy” se encaixa, mas foi a maldade excrachada da personagem que fez Streep torná-la tão popular).


Bette Davis tinha 54 anos na época em que esse filme foi gravado, já havia ganhado 2 Oscars de melhor atriz, e fora indicada outras 7 vezes para a estatueta na mesma categoria, por Jane Hudson, obteve sua décima indicação. Porém, desde 1955, após lançar “Lágrimas Amargas” (1952) e “A Rainha Tirana” (1955), a atriz estava encontrando dificuldades no cinema e teve de recorrer à televisão para ganhar a vida. Sendo assim, nada mais propício que ser ela uma das protagonistas desse longa. Claro que Davis nunca foi tão dissimulada quanto Jane Hudson, mas é óbvio que um pouco da atriz é carregado para a personagem, nos apresentando a melhor interpretação da carreira de Davis. Sua personagem é uma completa louca, uma degenerada, e Davis assume isso de forma incontestável, sendo debochada, sorrindo, chorando, gargalhando, cantando, dançando e falando como uma mulher cheia de distúrbios. Para mim os pontos altos da atuação de Davis são quando imita a irmã e quando recorda seu tempo de glória, além disso, a maguiagem carregada dá um tom ainda mais melancólico e a expressão triste e carrancuda é perfeita. Joan Crawford tem, em sua interpretação de Blanche Hudson, seu último grande papel, deixando de atuar em 1972. Assim como ocorreu com Davis, a partir de 1954 a carreira de Crawford tornou-se um desastre, e a atriz esteve apenas em filmes medianos, que não faziam jus ao seu talento. Dessa forma, nada mais propício que Joan estrelar esse filme ao lado de Bette Davis. A atriz está brilhante desde a primeira cena em que aparece assistindo a um de seus antigos filmes com os olhos cheios de lágrimas, mas são suas reações em relação as coisas que Jane faz contra Blanche que deixam sua atuação tão bela. O maior problema, entretanto, é a falta de reação da personagem, o que deixa Joan um pouco chata em alguns momentos, mas ver sua personagem enlouquecer ao lado da irmã torna o filme ainda mais sombrio e deprimente.



Não há como falar desse filme e não lembrar da rivalidade entre as protagonistas, sem rodeios: Davis e Crawford se odiavam. Enquanto uma (Bette) era a estrela da Wanner Bros. Pictures, a outra (Joan) era a queridinha da MGM. Davis chegou a dizer que Crawford havia dormido com todos os astros da MGM, exceto a Lassie. E mais, durante as filmagens de “Baby Jane”, Davis mandou que instalassem uma máquina da Coca-Cola no set (Joan era viúva de um dos presidentes da Pepsi), Crawford exigiu um camarim maior e ainda colocou pesos nas roupas que usava na cena em que a colega de cena tem de carregá-la. Quando Davis perdeu o Oscar de melhor atriz pelo filme para Anne Bancroft, Crawford fez questão de recebê-lo e quando Joan morreu, Bette declarou: “Não se deve falar mal de quem já se foi, só se deve falar coisas boas, como: ‘Que Bom, Joan Crawford morreu!’. Rivalidades a parte, não há como negar: Davis tem aqui a melhor atuação de sua carreira, e, podemos ter certeza, Crawford (não tão brilhante, mas ótima no papel) foi quem mais contribuiu para essa conquista, pois, provavalmente, sem o ódio que uma já nutria pela outra, nada teria sido tão belo. Por fim, destaco a beleza do desfecho do longa, quando vemos a personagem de Bette Davis rodopiando na areia enquanto sua irmã está jogada no chão, algumas pessoas a olham e, finalmente, mesmo que de uma maneira torta, Baby Jane renasce, sorrindo, e volta a ser a pequena Baby Jane Hudson que outrora encantou a todos. Mas, após tudo isso, ainda conseguimos desligar o filme e pensar se tudo aquilo era real, ficção, adaptação ou apenas mais um devaneio dessa arte tão enigmática que é o Cinema.


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