“Levamos apenas duas coisas da vida: os
lugares que conhecemos e o que comemos”
Nota: 8,0
Título Original: Last Holiday
Direção: Wayne Wang
Elenco: Queen Latifah, Gérard Departieu, LL Cool J, Timothy Hutton,
Ricardo Esposito, Alicia Witt, Jane Adams, Michael Estime, Susan Kallermann,
Matt Ross, Jascha Washignton, Ranjit Chowdhry, Michael Mouri, Jaqueline
Fleming, Kendall Mosby, Chloe Bailey
Produção: Laurence Mark, Jack Rapke
Roteiro: Jeffrey Prince, Peter S.
Seaman, J. B. Priestley (roteiro de 1950)
Ano: 2006
Duração: 112 min.
Gênero: Comédia
Georgia Byrd é uma simples vendedora em
uma grande loja varejista, apesar de tudo, é uma mulher feliz apaixonada por
comida e que sonha em se casar em Sean Matthews, outro vendedor da loja.
Entretanto, ao receber a notícia de que tem um tumor, ela decide fazer algumas
loucuras e pega todo o dinheiro que tem no banco e parte para Europa em uma das
férias mais inesperadas e incríveis que qualquer pessoa poderia sonhar. No
entanto, lá ela encontra um dos chefes de cozinha mais prestigiados do
continente, um senador, um congressista e sua esposa e o proprietário do
império para o qual ela trabalha, com sua amante.
Existem dois tipos de comédias no
cinema: as comédias e os besteiróis que conseguem se passar por comédias por
serem engraçados na cabeça da maior parte dos jovens modernos, que estão tão
alienados e condicionados a terem vontade de rir de qualquer coisa idiota que
não enxergam a essência das verdadeiras comédias. “As Férias da Minha Vida” se
encaixa, definitivamente, no primeiro estilo, justamente por não nos trazer
apenas um roteiro divertido que nos faz rir, mas por nos proporcionar uma
reflexão única acerca da vida e da morte. Para dirigir esse filme nada melhor
que Wayne Wang, um chinês pouco conhecido no mundo todo, mas que tem
experiência suficiente no cinema com esse gênero de filmes para nos trazer algo
digno de risadas e emoções diversas. Dentre seus filmes temos: “Um Amor em
Chinatown” (1989), “O Clube da Felicidade e da Sorte” (1993), “Cortina de
Fumaça” (1995), “O Último Entardecer” (1997), “Em Qualquer Outro Lugar” (1999)
e o ótimo “Encontro de Amor” (2002). Obviamente, a fotografia do filme, que tem
como maior trunfo o lugar onde Georgia passa suas férias, é uma personagem a
parte que faz de sua interpretação algo único. Mas, como de costume em filmes
desse estilo, o que mais interessa é a singularidade com a qual o roteiro é
escrito e a forma incrível como tudo se encaixa de forma perfeita. De início, o
fato de a protagonista encontrar com o dono do local onde trabalha acompanhado
da amante parece apenas uma forma tosca de se enrolar um pouco e fazer o filme
passar das duas horas, mas percebemos que isso serve para mostrar como existem
coisas mais importantes do que dinheiro, e como a vida pode ser mais
interessante se tivermos amigos. Em contraponto, Georgia também é a responsável
por deixar claro que a beleza de se ter dinheiro é usá-lo para ser feliz, e que
mais que ganhar dinheiro, o bom mesmo é saber usá-lo, usá-lo sem medo, sem
vergonha de conhecer coisas novas, ser feliz mesmo, afinal, se o dinheiro não
traz toda a felicidade, ao menos compra boa parte dela. Por fim, e talvez o mais
importante de tudo: a comida. Em uma das cenas mais naturais do longa, a
protagonista vai ao restaurante do hotel onde está hospedada e pede todos os
pratos do menu, de quebra começa uma amizade linda com o chefe de cozinha do
local, um ídolo da culinária.
Queen Latifah é uma das atrizes
americanas mais queridas em todo o mundo, simples, natural e muito simpática,
não há nenhum filme seu que não conquiste a todos, bastam alguns minutos na telona
pra mostrar o quanto pode ser competente em qualquer gênero. Como Georgia, ela
é algo inexplicável. Latifah e a personagem tem muitas coisas em comum: não tem
vergonha de seu tamanho, se acham lindas de sua forma – e, realmente, o são -,
são simpáticas com todos, são naturais e são aquele tipo clássico de negras
americanas que sabe o quanto sua gente sofreu no passado e não está na vida
para ser menos que feliz. Apesar de essas semelhanças serem sempre um ponto
muito negativo para uma atriz, Latifah consegue levar tudo muito bem, dando
conta do recado tanto em cenas cômicas – sua especialidade -, quanto em cenas
dramáticas. Mesmo que todo o elenco seja bom, tendo atuações satisfatórias,
como as de LL Cool J e Susan Kellerman, e outras um pouco forçadas, como as de
Alicia Witt e Timothy Hutton, me atenho a falar apenas sobre Latifah e sobre
apenas mais um ator do longa: Gérand Depardieu. O ator já é um símbolo nacional
e amado pela França, sua terra natal, e, assim como a protagonista, tem ao seu
encargo um personagem de alma muito limpa e iluminada: o tal chefe de cozinha,
que se torna amigo de Georgia rapidamente, e faz questão de dizer que é por sua
simplicidade e pela forma bela como vê a vida que prefere estar ao seu lado a
estar com grandes empresários ou políticos, pessoas famosas que deixaram os
reais prazeres simples da vida de lado, pois precisam se esconder atrás de
máscaras bonitas e bem apessoadas.
Certa vez, uma professora me disse ouvira
de uma senhora algumas das palavras mais sábias da vida: “Levamos apenas duas
coisas da vida: os lugares que conhecemos e o que comemos”. Tal pessoa se
referia a tudo na vida: lugares que conhecemos podem significar pessoas,
animais, lugares, línguas, aquilo que conhecemos na vida real e o que
conhecemos quando lemos um livro ou assistimos a um filme, novela, série; as
coisas que comemos são as coisas que experimentamos para nosso bel-prazer ,
seja referindo-se a comidas diferentes, novas opiniões, novos sentimentos,
cheiros ou sabores. Nada poderia definir melhor a essência e a beleza desse
filme que tais palavras, pois ao descobrir que irá morrer em breve, a
protagonista resolve jogar tudo para o alto, exorcizar sua mente de tudo aquilo
que a incomoda, tudo o que a pressiona para deixar sua vida para baixo e se
atira de cabeça em uma aventura que a leva para novos lugares e novas comidas,
novos amigos, novos amores, uma nova vida que mostrará que, como diria Fernando
Pessoa (e me permitam o tão odiado “clichessismo”), “tudo vale a pena quando a
alma não é pequena”.
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