A terceira noite da Mostra Competitiva Nacional do XI Panorama Internacional Coisa de Cinema teve como tema a juventude. Suas rotinas. Seus desejos. Seus medos. Seus passados. Seus amores e desafetos. Uma sessão para refletir as cabeças tão enigmáticas dos jovens do nosso país.
Imagens dizem mais que mil palavras.
Fotografias impressas são documentos que podem durar a eternidade. De forma
original e inovadora, A festa e os cães,
de Leonardo Mouramateus revela o diretor e seus amigos através de fotografias tiradas
no making off do curta História de uma
pena (apresentado no Panorama na noite de segunda-feira), em festas e nas
ruas. Em off, os amigos contam momentos de suas vidas tão diferentes, relembram
passagens e dialogam sobre passado, presente e futuro. A grande sacada do filme
é a habilidade de Mouramateus em contar histórias. A narrativa é clara, simples
e muito bem construída. As histórias são narradas como em multiplots: cada uma
tem suas particularidades, começam, terminam e não voltam mais. O ponto de
encontro entre elas são as próprias fotografias. Mesmo que seja um pouco
enfadonho em alguns momentos, A festa e
os cães é, definitivamente, um filme único, do tipo que não poderá ser
referenciado sem parecer uma cópia mal feita e sem graça.
Um dos momentos mais aguardados da
adolescência, a perda da virgindade, é o tema do curta Virgindade, de Chico Lacerda. Enquanto imagens de uma cidade
qualquer no Pernambuco passam na tela, a voz de Chico é ouvida em off narrando
acontecimentos de sua vida, desde os primeiros desejos sexuais, até o momento
em que descobre o sexo. Ainda nas imagens, vemos uma seleção de variados corpos
masculinos, referência ao desejo, ao prazer, à beleza do corpo humano em sua
essência. O problema, aqui é a forma como a história é contada, as palavras
usadas e a certa “forçassão de barra” em se naturalizar tudo o que se diz.
Nesse contexto, apesar de abordar um tema bastante pertinente, à medida que a
sociedade brasileira ainda trata o sexo como tabu, o que faz os jovens ficarem
bastante inseguros sobre o tema, Virgindade
tem um ritmo um pouco lento e uma narrativa que poderia ser mais bem elaborada.
Uma jovem está em uma balada. O som
ensurdecedor da música incomoda o espectador. Segundos depois, a jovem está
correndo. Parece fugir de alguém. Ela cai. Vira-se, encara a câmera e grita.
Agora já não há mais música, apenas o grito da jovem. Grito que incomoda,
ensurdece, agoniza, apavora. Mate-me por
favor, de Anita Rocha da Silveira, sustenta essa atmosfera gerada na
primeira sequência até seu último minuto. A história gira em torno de quatro
amigas adolescentes que vivem no Rio de Janeiro em uma época de uma onda de
assassinatos de jovens. O cotidiano delas (a escola, os amores, as festas, as
risadas) estão sempre presentes, mas é o subjetivo que mais chama a atenção.
Elas estão com medo dessas mortes, ou há alguma sensualidade que as conquista
por trás do perigo? Com planos gerais que mostram a Barra, local onde elas
moram, o filme utiliza a estranheza de uma parte da cidade do Rio de Janeiro
para revelar uma imensidão que assusta. Ou que conquista.
E é graças a uma direção de núcleo competente
e intepretações convincentes que logo nos damos conta de que mesmo os jovens da
história estão confusos em relação ao que sentem sobre essas mortes. É claro
que há um interesse demasiadamente grande. E não em saber quem é o assassino –
dúvida que não toma o filme em nenhum momento – e sim em saber como as mortes
aconteceram, quem eram as vítimas. Um interesse, talvez, em sentir na própria
pele pelo que as vítimas passaram. Com planos bem compostos e alguns bastante
longos, trilha sonora diversificada e sonoridade que, junto da montagem, segura
o ritmo e a tensão, o filme tem imagem e som como grandes trunfos para fazer o
espectador não sair da sala de cinema durante seus mais de 100 minutos, mesmo
que o conjunto do longa não agrade tanto assim. E no desfecho, mesmo que de
forma simples, uma constatação inesperada e arrebatadora. Ou, apenas, mais um
monte de dúvidas.
A juventude apresentada pelos filmes da
noite parece compor muito bem os jovens brasileiros. Curiosos pelo sexo,
sedentos de atenção, conquistados pela exclusividade, expostos às dificuldades
da vida, desanimados com as escolas, e ainda no desejo de curtirem a vida
adoidados como o personagem de Matthew Broderick do filme da década de 1980. Apesar
de temas um tanto clichês, os três filmes se mostram bastante inovadores na
forma como essas narrativas são contadas, atribuindo a histórias comuns ou até
corriqueiras para a sociedade brasileira (jovens num programa para quem não
completou o ensino médio, um garoto descobrindo a sexualidade e garotas com os sentimentos
à flor da pele em consequência de assassinatos muito inesperados) em eventos
interessantes e bastante instigantes.
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