Especial X Panorama Internacional Coisa de Cinema: "Camila", A Era de Ouro" e "Ela Volta na Quinta"
Em 2002, aconteceu a primeira edição do
Panorama Internacional Coisa de Cinema. Segundo seus realizadores, os cineastas
Cláudio Marques e Marília Hughes, “o sucesso daquele primeiro ano mostrou que o
público baiano estava ansioso para ver um cinema diverso”. Até o final daquela
década, os festivais de cinema ganharam força no Brasil todo. Este ano, o
Panorama será realizado entre os dias 29 de outubro e 2 de novembro e, além de
contar com as tradicionais competitivas de filmes baianos e de filmes
nacionais, o Festival conta com retrospectivas do cineasta americano Stanley Kubrick,
do cineasta russo Sergei Eisenstein e da cineasta francesa Mia Hansen-Love e
com mostras de filmes alemães e italianos. Para finalizar, esta edição traz o Laboratório de Roteiros, a já tradicional
oficina de Escrita Crítica e a nova oficina de Assistência de Direção,
ministradas, respectivamente, por Aleksei Wrobel, Fabio Meira e Felipe
Bragança, Rafael Carvalho e Marcelo Caetano.
Devido ao vínculo criado e alimentado
durante os últimos anos entre a capital baiana e a cidade de Cachoeira, a
poucos quilômetros de Salvador, desde 2012, na cidade, que abriga o curso de
Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, o CineClube
Mario Gusmão, projeto criado em 2010 pela Universidade, se tornou parceiro da
produtora Coisa de Cinema, apresentando alguns filmes e sediando oficinas na
cidade de Cachoeira durante a semana que o Panorama acontece em Salvador. Esse
ano, a oficina escolhida para a cidade foi a de Assistência de Direção, além de
mais de trinta filmes, dentre eles, os filmes de retrospectiva: “2001 – Uma Odisseia
no Espaço” (1968), de Kubrick, “Tudo Perdoado” (2007) e “O Pai dos Meus Filhos”
(2009), ambos de Hansen-Love; e filmes que vem fazendo sucesso em festivais no
país todo, como “My Name is Now, Elza Soares”, de Elizabete Martins Campos, “A
História da Eternidade”, de Camilo Cavalcanti e “Brasil S/A”, de Marcelo Pedroso.
Filme "Camila", de Clarissa Rebouças e Virginie Dubois |
Nesta segunda-feira (29), na cidade de
Cachoeira, foram apresentados os longas de retrospectivas “2001 – Uma Odisseia
no Espaço” e “Tudo Perdoado”, durante a noite, a Competitiva Nacional trouxe os
curtas “Camila”, de Clarissa Rebouças e Viginie Dubois e “A Era de Ouro”, de Leonardo
Mouramateus e Miguel Antunes Ramos, e o longa “Ela Volta na Quinta”, de André
Novais. “Camila” conta a história de uma jovem que vai à procura do marido de
quem não tem notícias há semanas no Canadá; “A Era de Ouro” apresenta uma
sociedade paulista protagonizada por um homem e uma mulher que vivem no mundo
da valorização extrema do dinheiro; e “Ela Volta na Quinta” revela uma
sociedade mineira muito simples e cotidiana, onde vive um casal de senhores e
seus filhos.
“Camila” é um filme de apenas seis
minutos que, como a própria diretora revelou, “tem que ser um tiro certeiro”,
como qualquer outro curta-metragem. Com uma câmera de mão ágil, o curta,
protagonizado por Clarissa, coloca o espectador no lugar da protagonista,
transforma quem assiste o filme em personagem, expondo-o a qualquer situação
vivida pela ficção. Pelo tempo de filme não há muito o que falar sobre esse
verdadeiro “tiro certeiro” sem revelar alguns elementos essenciais sobre seu
enredo, assim, apenas digo que quando a protagonista chega no Canadá, encontra
o marido e descobre algo surpreendente. O que fica são as surpresas e os
questionamentos: o que você faria no lugar dela? Correria? Faria um escândalo?
Chamaria a polícia? Tentaria se matar? Não faria nada? Ou não faria nada disso? Camila reagiu conforme sua
espontaneidade mandava, mas e você?
Filme "A Era de Ouro", de Leonardo Mouramateus e Miguel Antunes Ramos |
Se “Camila” já é um filme reflexivo que
põe em teste as relações humanas, o mesmo podemos dizer do filme que foi
apresentado na sequência. “A Era de Ouro” mostra um casal de amigos que foram
mais próximos na juventude, até que ela resolveu mudar para a capital. O curta
se passa em uma visita que David faz para Simone. Durante tal visita, os ânimos
se alteram enquanto o casal lembra do passado e David questiona por quê a vida
cheia de riquezas é tão importante para Simone. As questões aqui, entretanto,
diferem do filme anterior. Indagamo-nos qual o papel do dinheiro na sociedade,
por que o dinheiro e os bens materiais são tão importantes? Por que as pessoas
ricas dão tanta importância ao dinheiro? Em uma cena pra lá de metafórica
(aliás, o curta é pura metáfora), ricos empresários falam sobre a valorização
de uma padaria e contam que, para ganharem a conta pretendida, Simone teve que
seduzir o filho do dono da padaria. Vê-se a valorização clara do produto, e a
desvalorização de Simone (apresentada como outro produto). Que valor tem essa
era em que todos pensam e desejam dinheiro e poder?
“Ela Volta na Quinta” é um filme
realizado por André Novais e que conta com sua própria família no elenco. Não é
um documentário. É uma ficção. É a realidade na ficção. Ou a ficção na
realidade? O fato é que André escreveu um roteiro romântico sobre um casal de
senhores (seus pais) que vivem suas vidas juntos e, em um dado momento,
resolvem se separar. Paralelamente, existem as vidas de André e seu irmão. A
ficção está no divórcio, nas traições e nos elementos que nos lembra um romance
típico, a realidade está no perfil dos personagens, nas situações vividas (em
uma cena brilhante, André e o pai assistem a vídeos virais na internet), na
simplicidade de se viver a vida. Diferente dos outros filmes da noite, é um
drama mais simples, mais cotidiano. Semelhante aos curtas, é um filme que
explora as relações humanos de forma intensa, destacando a dualidade masculino-feminino.
As reflexões sobre a vida são muito intensas e chegam pelos momentos mais
íntimos, como quando a mãe relembra uma história do pai enquanto passa mal na
cama e é cuidada pelo filho. A vida é curta demais para nos preocuparmos tanto?
Vivemos mais do que deveríamos? Aproveitamos o suficiente o tempo que temos na
terra?
Filme "Ela Volta na Quinta", de André Novais |
“Camila”, “A Era de Ouro” e “Ela Volta
na Quinta” possuem mais que apenas reflexões sobre a vida e a exploração do
tema da dualidade em comum. São filmes de qualidades técnicas impressionantes.
Cada um chama a atenção por um aspecto. Para mim, foi a câmera de mão, as
metáforas e a exploração do cotidiano, respectivamente, que mais me atraíram para
dentro das produções. Se ao final de “Camila” é possível responder aos
questionamentos acerca da atitude da jovem é algo impossível de se dizer. Vai
de espectador para espectador. E talvez esse seja o melhor trunfo do curta. Quão
dourado é o mundo consumista e capitalista que vivemos e que é apresentado em “A
Era de Ouro” não sabemos. É um mundo do ouro encontrado pelos Europeus quando
chegaram ao Brasil, ou é o ouro de tolo deixado nas igrejas mineiras depois que
o outro real era roubado? A cada momento, parece que se pensa em quanto vale
cada ser humano, pior, por quanto cada ser humano pode ser vendido para dar
lucros a outras pessoas. E essa vida cotidiana? Essa simplicidade que encanta a
todos de forma tão singela e bela? Seria melhor viver cercado pelo luxo sem ter
amigos ou amores de verdade? Ou é melhor levar uma vida simples cheia de altos
e baixos e ter sempre pessoas amadas por perto? Quem sabe?
Conversa após a apresentação dos três filmes com Clarissa Rebouças e André Novais, onde os cineastas falaram sobre o processo de criação e de realização dos filmes e sobre suas intenções ao fazê-los. |
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