quinta-feira, 30 de outubro de 2014

DOS DILEMAS JUVENIS À PSIQUÉ HUMANA

Especial X Panorama Internacional Coisa de Cinema. Filmes: "Menino da Gamboa", "O Filme de Carlinhos", "O Velho Rei", "Materno", "Antiok" e "10-5-2012".



Na manhã desta quinta-feira (30), o X Festival Panorama Coisa de Cinema que acontece em Salvador e na cidade de Cachoeira, em parceria com o Cineclube Mario Gusmão, apresentou cinco filmes da Mostra Competitiva Baiana. “Menino da Gamboa”, de Pedro Perazzo e Rodrigo Luna, conta histórias de meninos da praia baiana e da influência dos garotos mais velhos sobre os mesmos; “O Filme de Carlinhos”, de Henrique Filho, é uma metalinguagem sobre um menino apaixonado por cinema que deseja realizar sua primeira produção; “O Velho Rei”, de Ceci Alves, traz um pai que vive no Rio de Janeiro e faz um vídeo para sua filha que mora em Salvador e que deseja se sentir mais perto dele; “Materno”, de Arlequine Sampaio e Ruy Dutra, é uma produção perturbadora sobre uma mulher grávida que cuida do filho em estado vegetativo; “Antiok”, de Dario Vetere, é uma ficção sobre uma sociedade utópica em que novos avanços tentam equilibrar de forma justa a humanidade; e “10-5-2012”, de Álvaro Andrade, é um surpreendente relato sobre um homem e seus desabafos sobre a vida.

Filme: “Menino da Gamboa”, de Pedro Perazzo e Rodrigo Luna
Os exemplos, segundo especialistas, são o que fazem o ser humano agir desde os primeiros passos até o último suspiro. O protagonista de “Menino da Gamboa” vê em seu irmão seu maior exemplo. Vendo o irmão mais velho trabalhando carregando bagagens de turistas em um carrinho de mão, o garoto sente a necessidade de fazer alguma coisa que se aproxime de um trabalho sério. Assim, deixa as brincadeiras infantis de lado, cria seu próprio carrinho e oferece seu trabalho de carregador a quem precisa. Mas será que as brincadeiras infantis devem ser deixadas de lado por uma criança para que ela se dedique ao trabalho? Em uma das cenas mais marcantes que vi nos últimos anos, o menino deve escolher entre brincar ou trabalhar. É com se ele fosse o Manuel de Glauber Rocha, ficando entre a cruz e a espada, entre Deus e o Diabo. Mas quem seria Deus e quem seria o Diabo para uma criança? No lugar dela, o que você escolheria?

Filme: “O Filme de Carlinhos”, de Henrique Filho
Um dos filmes mais tocantes para quem ama ou faz cinema, “O Filme de Carlinhos” é um curta-metragem tocante e emocionante. Carlinhos vive na companhia de um senhor que cuida de uma locadora e divide com o mesmo sua paixão pela Sétima Arte. Certo dia, ao invés de fazer os deveres de casa, o garoto resolve escrever um roteiro. Dali pra frente, mesmo sem o apoio do pai (que quer que o filho se torne um “doutor”) arruma os atores (colegas da escola), o operador de câmera, patrocínio e tudo o que ele acredita ser necessário para sua produção. Apesar de ter atores jovens pouco convincentes (mesmo que simpáticos), os atores mais velhos seguram a cena, o protagonista, Carlinhos, não titubeia no momento mais tocante do filme  e a qualidade da fotografia e do som são um primor. “O Filme de Carlinhos” é o tipo de metalinguagem que nos faz perguntar como seria se um filme fosse feito daquela forma. Como seria se crianças realizassem um filme como aquele? Quais seriam as intenções? Em que gênero se enquadraria? Quais seriam as inspirações? Qual seria o resultado final?

Filme: “O Velho Rei”, de Ceci Alves

Seguindo de “O Filme de Carlinhos”, um filme com o qual me identifiquei em vários momentos (desde o processo criativo até a reação dos familiares), veio “O Velho Rei”, que também me conquistou pelas identificações. Como a jovem que envia uma câmera ao pai, eu também vivi longe do meu pai durante anos. Enquanto vemos o esforço do homem em tentar fazer os vídeos para enviar à filha, questionamo-nos até que ponto nós seríamos capazes de fazer o mesmo. O homem em questão, interpretado magistralmente pelo veterano Antonio Pitanga, é um verdadeiro rei (com todos os atributos necessários para um homem ser justo e humano), e um velho também, uma alma velha e vivida que reconhece a necessidade de estar próximo à filha e de a filha estar próxima a ele, mesmo que distantes fisicamente. A veracidade e a emoção com a qual o pai grava e com a qual a filha assiste ao vídeo mostram o porquê a vida vale a pena.

Filme: “Materno”, de Arlequine Sampaio e Ruy Dutra
“Materno” possui uma atmosfera densa e perturbadora. É a história de uma mãe que, enquanto espera um filho nascer, também espera um filho morrer ou, em uma esperança distante (talvez utópica) renascer. A proposta do filme ao mostrar esses lados intensos da vida de Marta é incrível. Aquele filho deitado na cama, ora parece representar o filho que está dentro de Marta, esperando para vir ao mundo (seja morto ou vivo), ora parece a personificação do estado espiritual da protagonista, que, por sua vez, ora parece querer estar viva pelo filho que vem, ora parece preferir morrer junto do filho que está morrendo. A direção de arte e de som do curta são espetaculares, minimalistas e cheias de riquezas nos detalhes. Todavia, o conjunto da produção não é tão interessante quanto o esperado. O filme é longo demais e um pouco apelativo. A qualidade técnica é inegável, mas “Materno” não convence.
Filme:  “Antiok”, de Dario Vetere
Mais não convincente que “Materno”, entretanto, é “Antiok”, outra produção com uma proposta interessante, mas que não vai muito adiante disso. A história gira em torno de um rapaz cheio de diferenças que, na década de 1980, consegue prever o futuro da humanidade. Usando-o, alguns cientistas o estudam e tentam pensar em soluções para que o mundo não se perca nos próximos anos. Apesar de possuir fotografia exemplar e uma trilha sonora com músicas muito propícias para cada momento do filme, o ator que interpreta Antiok tenta ser mecânico para remeter à ficção, mas se torna superficial e pouco interessante. “Antiok” é um filme que funciona como primeiro capítulo de uma série. E talvez esse seja seu problema: é o tipo de produção que funciona como uma série, repleta de episódios sequencias, não como um filme único.

Filme: “10-5-2012”, de Álvaro Andrade

De todos os filmes apresentados durante essa sessão, confesso que “10-5-2012” era o filme que menos me animava. O início do curta se mostra uma real decepção e o problema dele é o mesmo dos dois anteriores: longo demais. Entretanto, a diferença está na forma como a proposta foi conduzida. “10-5-2012” traz um câmera que narra o filme todo em off enquanto observa outro homem, um rapaz com TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo) que vive perto de sua casa. O tal câmera, passa, então (e aí está o trunfo), a acompanhar o rapaz e refletir sobre sua vida e do “amigo”. Apesar de a câmera usada pelo homem não trazer uma boa imagem, o que prejudica a fotografia de forma triste. O câmera passa, segundo ele mesmo, a filmar à toa, como se fosse um hobbie, ou seja, sem muitas preocupações. Mas o que esse homem registra? O indivíduo com TOC e suas ações curiosas? Ou sua própria voz falando de sua vida? A câmera funciona como forma de registrar o movimentos do homem que está sendo observado? Ou é o mecanismo de o câmera externar suas opiniões, anseios, dúvidas?
Essa sessão pode ser facilmente dividida em dois grupos: ”Menino da Gamboa”, “O Filme de Carlinhos” e “O Velho Rei” são um deles, “Materno”, “Antiok” e “10-5-2012” são o outro. O primeiro é um grupo de filmes que mostram relações familiares e de exemplos. Como referências familiares, temos o irmão mais velho, os pais de Carlinhos e o pai que vive longe. Como exemplos, novamente o irmão mais velho, o dono de uma locadora e, novamente, o pai que está longe. No segundo grupo, temos uma visão um pouco mais perturbadora da vida, um lado diferente das reflexões humanas. “Materno” põe à prova o lado materno de cada mulher explorando o mais íntimo do corpo e da mente feminina, “Antiok” questiona quais os rumos a sociedade está tomando devido às suas atitudes e “10-5-2012” realça como o ser humano precisa tomar por base os problemas e vidas de outros seres humanos para encontrar a si próprios. Todos filmes que provocam as mais diferentes reações no público, o que os torna, no mínimo, curiosos.

Conversa com Pedro Perazzo e Rodrigo Lima, de "Menino da Gamboa", e com Camila Camila, de Materno após a sessão
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