Não é apenas mais uma das ótimas
comédias negras de Altman, é o seu triunfo em fim de carreira.
Nota: 8,8
(Chá às quatro. Jantar às oito. Morte à meia-noite) |
Título Original: Gosford Park
Direção: Robert Altman
Elenco: Maggie Smith, Michael Gambon, Kristin Scott Thomas, Camilla
Rutherford, Charles Dance, Geraldine Somerville, Tom Hollander, Jeremy Northam,
Bob Balaban, Ryan Phillippe, Stephen Fry, Kelly Macdonald, Clive Owen, Helen
Mirren, Eillen Atkins, Emily Watson, Alan Bates, Richard E. Grant, Derek
Jacobi, Jeremy Swift
Produção: Robert Altman, Bob
Balaban, Julian Fellows, David Levy
Roteiro: Julian Fellowes, Robert Altman e Bob Balaban
Ano: 2001
Duração: 137 min.
Gênero: Drama / Suspense
Durante muito tempo a Inglaterra soube
dividir suas casas familiares entre o andar de cima e o andar de baixo (ou no
sótão), no primeiro viviam os nobres, homens e mulheres ricos com suas lindas
famílias compostas por filhas e filhos maravilhosos que herdariam todo esse
luxo, riqueza e títulos, o segundo era habitado pelos empregados da casa,
mordomos, governantas, arrumadeiras, cozinheiras, valetes e outras pessoas
filhas de pequenos fazendeiros, empregados ou comerciantes, que desejavam uma
vida mais segura e digna para seus filhos, afinal, ser empregado em uma grande
casa de um nobre importante era o máximo que pobres conseguiriam. Muitos filmes
e séries retratam essa convivência e dependência entre um ou outro: tanto os
empregados necessitam de seus patrões para serem pagos, quanto os proprietários
das casas (ou melhor, mansões), ruiriam se fossem abandonados pela criadagem.
Gosford Park está totalmente preparada
para receber inúmeros hóspedes para uns dias de caçada na propriedade de Sir
William McGordle e sua esposa Lady Sylvia. No entanto, essa caçada irá agitar
muito mais do que se pensava, e não apenas o andar destinado aos convidados,
mas também o destinado aos empregados. Cada casal convidado traz, consigo um ou
dois empregados para lhe servirem durante a estadia na casa. Dentre eles temos
a excêntrica Constance, Condessa de Trenthan, com sua criada Mary; o astro de
Hollywood Ivor Novello, seu produtor Morris Weissman e o conquistador criado
deles Henry Denton; o orgulhoso e impotente Lord Raymond Stockbridge e sua
esposa Louisa Stockbridge, com seu criado Robert Parks; e o confuso Anthony
Meredith e sua esposa Lavinia Meredith. Em meio a tanta diversão, libertinagem,
falcatruas e conspirações, eis que ocorre o assassinato de ninguém mais ninguém
menos que o anfitrião da palhaçada, Sir William McGordle. Quem planejou o
assassinato? Quem é o assassino? O que acontecerá com Gosford Park? E quanto ao
destino dos criados? Essas são apenas algumas das perguntas a serem respondidas
ao longo da trama.
A união de um mestre do cinema satírico,
o diretor Robert Altman, e de um roteirista de mãos cheias, Julian Fellowes,
não poderia ser melhor. Altman, que fez apenas mais dois filmes antes de morrer
(nenhum superior a esse), ficou conhecido e eternizado por seu estilo
totalmente próprio em ironizar todos os acontecimentos mais inusitados
possíveis. Com muito humor, faz desse filme algo maravilhoso, claro que o local
das filmagens é lindo, mas fazer com que um filme de mais de duas horas ocorra
em apenas essa casa e, basicamente, dentro dela, e fazer com tanta qualidade e
categoria não é para qualquer um. Fellowes, por suas vez, nos proporciona um
ensinamento sobre o que era a sociedade inglesa há menos de cem anos, mostrando
como os empregados eram tratados, o fato de a criadagem mal ser chamada pelo
nome para ser reconhecida, como os ricos tratam uns aos outros escada acima e
como ele desejam ser livres dos compromissos sociais. Fellowes é, também, o
roteirista de uma minissérie inglesa maravilhosa que acabou virando uma série,
“Downton Abbey” (2010 – 2012), ambientada na Primeira Guerra Mundial, aborda
essa mesma relação entre os nobres e seus criados, mas é menos denso em relação
ao tratamento dos empregados e bem mais profundo nos sentimentos de todas as
personagens, uma série simplesmente maravilhosa que eu recomendo para todos. Para completar essa dupla ótima, ainda temos o sempre excelente compositor Patrick Doyle para deixar cada cena ainda mais bela ou intrigante.
No mundo todo ingleses são censurados
por alguns de seus comportamentos, mas é sempre um alívio saber que um elenco é
composto basicamente por ingleses: são eles que compõem no mínimo 85% desse elenco
perfeito, e garanto que todos já viram vários deles, mas não se recordam. Maggie
Smith é Constance Trentham, uma mulher cheia de si, arrogante ao extremo, que
sabe o que quer, preocupa-se apenas consigo mesma e seu futuro, o curioso de
assistir a interpretação de Smith, é que essa sua personagem e a que ela dá
vida em “Downton Abbey” são muito parecidas: inglesas perfeitas que mantêm
todos os costumes possíveis, mas ela é uma atriz tão fantástica que compõe cada
personagem a seu modo e as deixa totalmente diferentes. Outro ator inconfundível,
Michael Gambon, apesar de não ser inglês, interpreta William McCordle, um homem
que fez muitas coisas erradas na vida, despreza a tudo e todos, menos seu
cachorrinho de estimação odiado por toda a família, preferindo ficar sozinho se
não pode ter o controle de tudo a sua volta, Gambon tem a mesma avaliação de
Smith, perfeito no papel, a dupla trabalhou junto nos filmes da saga “Harry
Potter”, ela como Minerva McGonagoll e ele como Alvo Dumbledore. Kristin Scott
Thomas, de “O Paciente Inglês” (1996), é uma Lady McCordle que já não aguenta
mais o marido e deseja apenas viver ao seu lado pelo conforto e luxo, ainda é
orgulhosa e despudorada. Charles Dance, o Tywin Lannister de “Game of Thrones”
(2011-2012), é o Lord Stockbridge, severo, frio, aparentemente sem sentimentos,
outro ator que tem em suas mãos uma personagem parecida com a da série, mas que
a leva de forma magnífica e diferenciada em ambos os casos. Tom Hollander, que na
franquia “Piratas dos Caribe” é Cutler Beckett, aqui é o Sr. Meredith, com quem
McCordle pretende desfazer alguns negócios que podem arruiná-lo; Jeremy Norton, oriundo da série “The
Tudors” (2007-2008), onde dá vida ao lendário Sir Thomas More, vive o astro
bonito, gentil e de voz mansa Ivor Novello; Kelly MacDonald, a Margaret Schroeder de Boardwalk Empire (2010-2011) é a iniciante Mary, criada da Condessa
Trentham; Clive Owen, o Larry do cultuado “Closer – Perto Demais” (2004), é o
criado Parks; Emily Watson, vinda do ótimo “Dragão Vermelho” (2002), é umas das
empregadas mais familiarizadas com o emprego e a família a qual serve, Elsie;
por fim, a fantástica Helen Mirren, vencedora do Oscar por “A Rainha” (2006), é
a governanta Sra. Wilson, uma mulher fechada, mas excelente servente, em suas
palavras, por saber o que seus patrões desejam mesmo antes deles terem certeza.
Falar sobre um filme com tanta qualidade em uma crítica
pequena é impossível, portanto me estendo mais um pouco para salientar como
essa análise sobre as relações humanas é precisa, nos afirmando o que já
sabíamos: não há como exigir que todos os costumes de um povo mude, afinal,
eles foram criados com eles e para mantê-los o mais firme possível. Esse filme
não é apenas uma crítica à sociedade da época e seus costumes ultrapassados,
que somente viriam a acabar por completo na Segunda Grande Guerra, é uma obra
de arte onde Fellowes, como fará em “Downton Abbey” dez anos depois, revela o
quanto os ingleses eram preparados para as desventuras da vida, pelo simples
motivo de que dezenas de coisas acontecem durante poucos dias, mas, como em
todas as grandes casas das ricas famílias inglesas da época, tudo volta ao
normal, por que é assim que os ingleses serão para toda a eternidade:
inexplicáveis e dignos de cópia, por seu imenso e milenar tradicionalismo.
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Ótima resenha, Rafael! Eu só acrescentaria Alan Bates, como o atormentado Jennings...=) Parabéns!
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