Especial X Panorama Internacional Coisa de Cinema. Filmes: "O Completo Estranho", "Tenho um Dragão que mora Comigo", "Sem Coração", "O Bom Comportamento" e "Quinze"
O dia de domingo (02) foi o último dia
do X Panorama Internacional Coisa de Cinema na cidade de Cachoeira, onde o
festival é realizado em parceria com o Cineclube Mário Gusmão, que funciona
atrelado ao curso de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Recôncavo
da Bahia. Os filmes começaram a ser exibidos com uma sessão da Mostra
Competitiva Nacional às 14h, com a apresentação de cinco filmes em
curta-metragem. Os primeiros foram dois filmes cearenses: “O Completo Estranho”
e “Tenho um Dragão que Mora Comigo”, dirigidos, respectivamente, por Leonardo
Mouramateus e Wislan Esmeraldo. Depois, foi a vez de um filme pernambucano,
estado que marcou forte presença no evento, com o filme “Sem Coração”, de Nara
Normande e Tião. O quarto filme foi o paulista “O Bom Comportamento”, de Eva
Randolph. Para finalizar a sessão, o filme mineiro “Quinze”, de Maurílio
Martins.
“O Completo Estranho” gira em torno da
relação de dois jovens que se conhecem em uma festa. Ela foi até o local com o
namorado para “salvar” uma amiga em apuros. Ele é o anfitrião. No meio de um
apagão, os personagens, que, supostamente, nunca haviam se visto, acabam se
encontrando. Eles continuam sem se ver, mas começam a se ouvir e a conversar
sobre os mais diversos temas. O maior trunfo do filme é a forma como os
contornos humanos são explorados pela falta da luz (devido ao apagão). É essa
falta de luz, e a precisão dos contornos, que lembram que os seres humanos são
feitos de sua índole, de seu interior, de seu espírito, e não de sua carne, de
sua cor, de sua imagem exterior. Os personagens, assim, sem nenhum preconceito
começam a conversar. Segundo ele, ele já havia a visto na festa, mas ela não
tem nem ideia de como ele se parece fisicamente. O problema são diálogos muito
pontais, marcados e teatrais demais. O curta é feito, sem dúvida, pela poética
da imagem e dos contornos, mas é levado pelos diálogos de forma lenta e sem
graça.
Filme: "O Completo Estranho", de Leonardo Mouramateus |
Uma mulher arruma sua casa, prepara um
bolo e espera seu amante chegar. Em “Tenho um Dragão que mora Comigo”, os
personagens são muito normais, suas atitudes muito cotidianas, a casa onde se
encontram muito realista, as atitudes e diálogos muito naturais. Como muitos
curtas, é um filme quase documental, sem pudor e sem medo de mostrar a
realidade que assola os personagens. De forma simples, o curta consiste em
apresentar uma mulher que espera por alguém. Em nenhum momento nos é revelado
quem é essa pessoa até que o homem chegue. E mais, temos a certeza de que essa
espera é longa e voltará a ser tão longa quanto. A fotografia e a direção de arte
do filme são precisas e as cores que vemos em cada cena dialogam de uma forma
ou outra sempre. O dragão do título pode ser visto como esse amor grande e
cheio de calor que a mulher possui em seu peito. Ou também pode ser uma
referência ao vazio imenso que a personagem sente quando está longe de seu
amado. Quem sabe?
Filme: "Tenho um Drgão que mora Comigo", de Wislan Esmeraldo |
“Sem Coração” foi, sem dúvida, um dos
curtas mais interessantes apresentados durante o Panorama. A história acompanha
um jovem que vai visitar os tios e o primo em uma praia nordestina. Lá, o
menino, de aproximadamente treze ou quatorze anos, conhece outros meninos que o
apresentam à Sem Coração, uma garota da mesma idade com quem os meninos se
relacionam sexualmente. Para começar, o filme já impressiona pela interpretação
e maturidade dos intérpretes das crianças que levam toda essa descoberta sexual
de forma muito realista. É a impressão do que eles mesmos vivenciavam quando o
curta foi realizado. Ainda nesse contexto, chama a atenção a construção da
personagem de Sem Coração. A metáfora tem a ver com uma cicatriz que a garota
tem no peito, mas também diz respeito à forma como ela se relaciona com todos
os meninos, sem se apegar a nenhum deles. Qualquer semelhança não é mera coincidência,
segundo Nara Normande, a personagem é baseada em um pessoal real. A fotografia
do filme é imponente e utiliza o sol e as praias de forma muito inteligente.
Filme: "Sem Coração", de Nara Normande e Tião |
Isolados, adolescentes se divertem em
uma colônia de férias em “O Bom Comportamento”. Laura, porém, está totalmente
sozinha no local depois que seu único amigo se vê obrigado a ir embora. Com o
tempo, ela se aproxima de um belo garoto e os dois voltam ao tema das descobertas
sexuais da adolescência. Durante o filme, uma colega de quarto de Laura conta a
história de uma jovem grávida que morreu no acampamento e assombra a cachoeira
local. Com o passar do curta, é difícil compreender sobre o que a história está
tentando falar: sobre Laura ou sobre a jovem que morreu há anos? Podemos até
levantar a hipótese de que Laura é a própria jovem que veio levar o belo rapaz.
Mas isso não condiz com a personagem contada pela colega de Laura: na “lenda”,
a morta vem para buscar crianças, não qualquer um. A dúvida sobre quem é o real
protagonista, paira no ar mesmo após o termino do filme. Assim sendo, o filme
cria uma confusão que acaba tomando conta do espectador, restando um bom
trabalho de decupagem, direção fotográfica e de interpretações para o filme
valer a pena.
Filme: "O Bom Comportamento", de Eva Randolph |
O filme “Quinze”, surpreendentemente,
relata, mesmo, o aniversário de quinze anos de uma jovem. Mas isso é apenas um
pano de fundo para apresentar a relação de uma mãe e uma filha que não sabem
até que ponto se conhecem. Não que o filme seja um tramalhão sobre as
dificuldades de se ser mãe ou de se ser filha. Muito pelo contrário, é um
retrato real e imprevisível dessa relação. O grande trunfo dessa produção, além
da veracidade da história (o que inclui pequenas discussões, revelações
interessantes, contas a serem pagas, muita risada e um pouco de choro
emocionado) são as interpretações de Karine Teles e Malu Ramos (mãe e filha,
respectivamente). Mais inacreditável ainda, é ver que as duas sustentam planos
extremamente longos com diálogos cotidianos e cheios de surpresas. Além disso
tudo, existe uma relação homossexual muito tranquila e apaixonada entre Raquel
(a mãe) e outra mulher, o que confere ao curta um tom mais moderno e de
militância contra o preconceito e pela aceitação da diversidade.
Filme: "Quinze, de Maurílio Martins |
De uma forma ou outra, todos os filmes
dessa sessão fazem referências aos encontros e desencontros da vida humana. “O
Completo Estranho” aborda o desencontro da protagonista e do namorado, o que
culmina no encontro com o anfitrião da festa. Em “Tenho um Dragão que mora
Comigo” a protagonista espera ansiosa o encontro entre ela e o amado que está
chegando, após tanto tempo de saudade guardada. Em “Sem Coração”, há o encontro
do protagonista com a família do tio, com os garotos de mesma idade, com a
menina Sem Coração e, por que não, com os desejos carnais que afloram a cada
dia. “O Bom Comportamento” é o encontro entre a jovem excluída e o moço bonito,
mas também é o encontro com a sexualidade (sempre presente durante a adolescência)
e entre os mundos do real (representado pelo acampamento) e do “imaginário”,
representado pela cachoeira onde, supostamente, está a moça que morreu. Em “Quinze”,
por fim, talvez esteja a maior dificuldade de descobrir onde estão os encontros
e desencontros, mas basta ter um pouco de imaginação para ver o encontro de uma
mãe e sua filha, o encontro entre duas mulheres e o encontro de todas as
diversidades, das aceitações e das tolerâncias. Cinco filmes retratando um dos
maiores fatos da vida humana na terra: a vida é feita de encontros e
desencontros.
Especial Premiação: Antes que os vencedores da premiação sejam anunciados, aqui estão os meus preferidos. Levando em consideração os 17 filmes da Competitiva Nacional apresentados na cidade de Cachoeira, mais os longas "Branco Sai, Preto Fica" e "Homem Comum" e os curtas "La Llamada" e "E", assistidos recentemente no CachoeiraDoc, também em Cachoeira) e os sete filmes (seis curtas e um longa) da Competitiva Baiana (mais o curta "No Seu Giro, Corpo Leve", assistido anteriormente). Devido ao numero de prêmios distribuídos, decidi colocar dois vencedores por categoria.
Melhor Filme Longa-metragem Nacional: "A História da Eternidade", de Camilo Cavalcanti, e "Castanha", de Davi Pretto.
Melhor Filme Curta-metragem Nacional: "Carranca", de Marcelo Matos e Wallace Oliveira, e "Parque Soviético", de Karen Black.
Melhor Filme Baiano: "Menino da Gamboa", de Pedro Perazzo e Rodrigo Luna, e "O Velho Rei", de Ceci Alves.
EM BREVE, os vencedores oficiais pelos júris selecionados pelo X Panorama Internacional Coisa de Cinema!
Especial Premiação: Antes que os vencedores da premiação sejam anunciados, aqui estão os meus preferidos. Levando em consideração os 17 filmes da Competitiva Nacional apresentados na cidade de Cachoeira, mais os longas "Branco Sai, Preto Fica" e "Homem Comum" e os curtas "La Llamada" e "E", assistidos recentemente no CachoeiraDoc, também em Cachoeira) e os sete filmes (seis curtas e um longa) da Competitiva Baiana (mais o curta "No Seu Giro, Corpo Leve", assistido anteriormente). Devido ao numero de prêmios distribuídos, decidi colocar dois vencedores por categoria.
Melhor Filme Longa-metragem Nacional: "A História da Eternidade", de Camilo Cavalcanti, e "Castanha", de Davi Pretto.
Melhor Filme Curta-metragem Nacional: "Carranca", de Marcelo Matos e Wallace Oliveira, e "Parque Soviético", de Karen Black.
Melhor Filme Baiano: "Menino da Gamboa", de Pedro Perazzo e Rodrigo Luna, e "O Velho Rei", de Ceci Alves.
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