quinta-feira, 6 de novembro de 2014

INDUSTRIALIZAÇÃO E OUTRAS COISAS MAIS...

Especial X Panorama Internacional Coisa de Cinema. Filmes: "Com Fome no Fim do Mundo" e "Brasil S/A"




O X Panorama Internacional coisa de cinema aconteceu durante os dias 29 de outubro e 5 de novembro contemplando as cidades de Salvador e de Cachoeira. Na capital baiana, o evento apresentou filmes no Espaço Itaú de Cinema – Glauber Rocha e na Sala Walter da Silveira, com 129 filmes. Em Cachoeira, o evento durou até o dia 2 de novembro e foi realizado no auditório do Centro de Artes, Humanidades e Letras da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, em parceria com o Cineclube Mário Gusmão, uma extensão criada pela professora Cyntia Nogueira com a participação dos alunos do curso de Cinema e Audiovisual da UFRB. Em Cachoeira, foram apresentados 34 filmes. Dentre os filmes do festival, estavam curtas e longas-metragens, filmes de ficção e de documentário, filmes americanos, asiáticos, europeus, filmes de animação e em live-action. Filmes para todos os gostos e idades, sobre os mais diversos temas. Durante o festival, foram apresentados alguns filmes do americano Stanley Kubrick, do russo Sergei Eisenstein e da francesa Mia Hasen-Love.
Como morador da cidade de Cachoeira e estudante do referido curso de Cinema e Audiovisual, decidi fazer a cobertura dos filmes apresentados na cidade. Dos 34 filmes, tive a oportunidade de assistir e escrever sobre 29 deles (incluindo os dois filmes desta análise). São os filmes das Mostras da Competitiva Nacional, da Competitiva Baiana e Panorama Brasil (em Salvador, ainda foram apresentados filmes da Competitiva Internacional, Panorama Alemão, Panorama Italiano e Animage). Os 29 filmes (na ordem em que foram assistidos e tiveram suas críticas publicadas) foram: “Camila”, “A Era de Ouro”, “Ela Volta na Quinta”, “Menino da Gamboa”, “O Filme de Carlinhos”, “O Velho Rei”, “Materno”, “Antiok”, “10-5-2012”, “My Name is Now, Elza Soares”, “Castanha”, “O Clube”, “A História da Eternidade”, “Tejo Mar”, “Permanência”, “Parque Soviético”, “A Doce Flauta da Liberdade”, “Estátua!”, “Carranca”, “Ventos de Agosto”, “O Completo Estranho”, “Tenho um Dragão que mora Comigo”, “Sem Coração”, “O Bom Comportamento”, “Quinze”, “Nua por Dentro do Couro”, “Sinfonia da Necrópole”, “Com Fome no Fim do Mundo” e “Brasil S/A”. No blog ainda pode ser conferida a análise do filme “Homem Comum”, apresentado, durante o Panorama, em Salvador e, semanas antes, durante o Festival de Documentários de Cachoeira, o CachoeiraDoc, nesta cidade.

Equipe do Cineclube Mário Gusmão que realizou o X Panorama Internacional Coisa de Cinema na cidade de Cachoeira
“Com fome no fim do Mundo”, filme baiano de Marcus Curvelo e realizado pelo Cual (Coletivo Urgente de Audiovisual), que já possui mais de duas centenas de produções realizadas, conta a história de um músico que, enquanto não consegue ganhar a vida como musicista, passa os dias vendendo imóveis na cidade de Salvador. Raul Seixas, como o próprio “corretor” se denomina, vai de um lado a outro tentando tirar vantagem das vendas que tenta realizar, sempre sonhando em poder ter um carro caro, comprar um desses apartamentos que ele tenta tanto vender e ter uma vida farta. O curta, contemplado pelo edital “Arte em toda Parte”, da fundação Gregório de Matos, discute, assim, o desenvolvimento desenfreado da urbanização no contexto social brasileiro. Além disso, aborda como algumas classes trabalhadoras são mais beneficiadas que outras, devido a uma demanda social absurda e um desejo consumista e pelo poder que só cresce. O protagonista, devido a esses problemas, vagará pela cidade esperando que um milagre aconteça, mesmo sabendo que suas esperanças para ser o que realmente deseja, sejam praticamente nulas. Mas o personagem não tem a mínima chance de sobrevier ali por que não é esforçado? Ou por que o sistema o coloca em uma situação de impotência? E as vendas, por que elas não dão certo? Qual será o melhor caminho para isso? De quem é a culpa? Do músico, dos ricos, dos pobres, dos políticos ou de um sistema falho?

Filme: "Com Fome no Fim do Mundo", de Marcus Curvelo
“Brasil S/A” é um dos filmes mais comentados e adorados do ano. E não é para menos. O filme aborda a industrialização e a forma como o país cresceu nos últimos anos, apresentando imagens para que isso seja evidenciado. Rapidamente, tem-se uma contextualização mostrando os cortadores de cana e a chegada das máquinas no local onde eles trabalham. Assim, já inicia uma seleção de operários: os que aprenderem a mexer nas máquinas ficam com seus empregos, o que não aprenderem, voltam para casa desempregados. Depois, é mostrada a dualidade entre o tráfego caótico das cidades grandes e a tranquilidade utópica de um barquinho navegando em um rio – utópica, por que o homem que navega, vê ao seu redor a destruição da máquina e a inserção de uma ponte de concreto. Ainda é mostrada uma “solução” prática e cômoda para o problema do trânsito na cidade grande: o “Cegonha Drive”, um daqueles caminhões que carrega carros e que carregam os meios de locomoção com seus proprietários enquanto estes relaxam. Por fim, o filme, de caráter documental, apresenta uma sequência de imagens bem diferentes: a busca pela redenção em um culto, a montagem de carros, a escavação em busca de petróleo e a destruição da sociedade por sua alienação e comodidade. Nada melhor para definir o mundo de hoje.

Filme: "Brasil S/A", de Marcelo Pedroso
No Brasil, a primeira região a ser industrializada foi o sudeste devido à produção cafeeira e de cana-de-açúcar e os capitais resultantes delas. Após a Segunda Guerra Mundial, a Europa estava destruída e o Brasil acabou aumentando sua produção industrial para comercializar com aquele continente. De lá até hoje, a industrialização aumentou a cada ano e trouxe danos sérios para a sociedade. “Brasil S/A” não expõe isso de forma escancarada e sensacionalista, e sim, de forma sutil e muito metafórica para que o espectador pense em suas atitudes e no que elas acarretam apara a sociedade. Além de as imagens serem totalmente representativas e propícias para o longa, a fotografia do filme é maravilhosa, apresentando imagens que tomam a tela de forma única. Essa, entretanto, não é a única maneira encontrada para que o espectador esqueça a singularidade de o filme não possuir falas – o que gera um estranhamento para grande parte do público. A sonoplastia da produção também é incrível, intensificando ruídos como o do remo na água, do caminhar dos homens, do cortar da cana, do canto dos pássaros e os coloca no mesmo patamar que o som estrondoso dos navios, das serras elétricas, dos caminhões que cavam a terra. As músicas escolhidas para o filme são que dão o tom das emoções sentidas.

Marcus Curvelo, Ramon Coutinho e Bianca Muniz
“Com Fome no Fim do Mundo” e “Brasil S/A”, obviamente, dialogam a partir do momento que se debruçam sobre os avanços tecnológicos da sociedade, que acarretaram na construção de mais e mais prédios – supervalorizados desde a metade da década passada – e na crescente implantação de indústrias por todo país, bem como o uso de novas tecnologias para esses dois ramos: o imobiliário e o industrial. Enquanto “Com Fome no Fim do Mundo” aposta em um enredo narrativo mais clássico, perdendo-se em vários momentos, “Brasil S/A” aposta em inovar (como as próprias indústrias fazem o tempo todo) e apresenta uma produção diferenciada e surpreendente. Este, é o tipo de filme que, sem dúvida, atende a todos os seus propósitos. Na cidade de Cachoeira, os maiores destaques do festival foram os longas “My name is Now, Elza Soares”, da Mostra Panorama Brasil, e os longas da Competitiva Nacional “A História da Eternidade”, “Ventos de Agosto” e “Brasil S/A”. Abaixo, confira os vencedores da X edição do Panorama Internacional Coisa de Cinema.

VENCEDORES DO X PANORAMA INTERNACIONAL COISA DE CINEMA
Competitiva Nacional de Longas:
Melhor Filme: “Ela Volta na Quinta”, de André Novais
Prêmio Especial: “Casa Grande”, de Felipe Barbosa

Competitiva Nacional de Curtas:
Melhor Filme: “Sem Coração”, de Nara Normande e Tião
Prêmio Especial: “Quinze”, de Maurílio Martins

Prêmio IndieLisboa
Melhor Filme Longa: “Ela Volta na Quinta”, de André Novais
Melhor Filme Curta: “Quinze”, de Maurílio Martins

Prêmio Ficunam
“Ela volta na quinta”, de André Novais

O Panorama Internacional Coisa de Cinema é realizado com coordenação do cineasta Claudio Marques e com produção da cineasta Marília Hughes
Competitiva Baiana
Melhor Filme: “O Menino da Gamboa”, de Rodrigo Luna e Pedro Perazzo
Menção Honrosa: “10-5-2012”, de Álvaro Andrade.

Prêmio André Setaro – Melhor Filme Baiano (Júri APC-BA)
“Revoada”, de José Umberto Dias

Prêmio João Carlos Sampaio (Júri Jovem)
Longa: “Brasil S/A”, de Marcelo Pedroso
Curta: “Quinze”, de Maurílio Martins
Menção honrosa: “Mater Dolorosa”, de Tamur Aimara e Daniel Caetano

Competitiva Internacional
Longa: “Nagima”, de Zhanna Issabayeva – Casaquistão
Menção honrosa (longa): “Como desaparecer completamente”, de Raya Martin – Filipinas
Curta: “Xenos”, de Mahdi Fleifel – Reino Unido/Dinamarca


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