Com grandes interpretações, roteiro ágil
e direção impecável, “Capitão Phillips” é uma produção memorável.
Nota: 9,6
Título Original: Captain Phillips
Direção: Paul Greengrass
Elenco: Tom Hanks, Barhad Abdi, Barkhad
Abdirahman, Faysal Ahmed, Mahat M. Ali, Michael Chernus, David Warshofsky,
Corey Johnson, Chris Mulkey, Yul Vazquez, Max Martini, Omar Berdouni, Mohamed
Ali, Issak Farah Samatar, Thomas Grube, Mark Holden, San Shella, Terence
Anderson, Marc Anwar, David Webber
Produção: Dana Brunetti, Michael De
Luca, Scott Rudin
Roteiro: Billy Ray e Richard Phillips e Stephen Talty (livro: “A
Captain’s Duty: Somali Pirates, Navy SEALS, and Dangerous Days at Sea”
Ano: 2013
Duração: 134 min.
Gênero: Drama / Biografia / Thirller
O Chifre da África é uma região no
extremo leste do continente africano. Constituído por Djibouti, Etiópia,
Eritréia e Somália, a região é uma das mais perigosas, violentas e pobres do
mundo. Esses países também são vítimas de intensos conflitos intermináveis
entre si e por guerras civis. A Etiópia, por exemplo, sofre, continuamente por
uma desestruturação política e a Somália deixou de ter um governo nacional em
funcionamento desde 1991. Outro grande problema da região é o fato de se
localizar no Golfo de Áden, entrada para o Mar Vermelho, rota comercial
marítima utilizada até hoje. Sendo assim, a formação de grupos piratas foi
formada como reflexo dos problemas pelos quais o países passam. Apesar de
navios de guerra estarem mobilizados na área para conter os ataques, os
piratas, sobretudo somalis, continuam em exercício.
O verdadeiro Capitão Richard Phillips |
Em abril de 2009, estimou-se que cerca de 260 tripulantes de navios sequestrados na
costa da Somália foram mantidos reféns. O Capitão Richard Phillips foi um
deles. No dia 8 daquele mesmo mês, O Capitão e sua tripulação de 20 indivíduos
foram abordados por quatro somalis armados que exigiam uma quantia absurda de
dinheiro para libertá-los. Em um ato corajoso e admirável, Phillips deteve os
homens por algumas horas e aceitou deixar o navio com os quatro para que sua
tripulação fosse poupada. Até o dia 12 de abril, Phillps foi matido refém em um
barco salva-vidas, quando foi resgatado pela Quinta Frota da Marinha Americana.
Três dos homens que sequestraram o Capitão foram assassinados e um foi levado
aos EUA sob custódia. Phillips voltou ao mar em 2010.
No filme, Phillips, um homem de 53 anos,
leva sua rotina diária como qualquer outro americano: despede-se da esposa,
conversa sobre a educação do filho mais jovem e pega um avião que o levará ao
destino de seu próximo trabalho. Ao chegar em Omã, o Capitão toma à frente de
um navio cargueiro dinamarquês com bandeira estadunidense de 17 toneladas
carregado com comida e água para ajudar o povo do Quênia, da Somália e da
Uganda. Após alguns dias de viagem, o Capitão começa a se preparar para
qualquer eventual ataque pirata que possa ocorrer, afinal, eles navegam por
águas internacionais próximas à Somália. Não demora muito e os medos de
Phillips se tornam realidade: o navio é atacado por quatro somalis que desejam,
sobretudo, dinheiro. Para salvar sua tripulação, Phillips controla a situação e
se oferece como refém aos sequestradores, e é aí que sua vida se torna um misto
de inferno e incerteza.
Não há dúvidas de que o ato de se
entregar aos piratas por sua tripulação tenha sido um ato louco de Richard
Phillips, mas também, nenhum ser humano questionaria a beleza de sua atitude. O
Capitão sabia, e isso nos fica claro quando vemos o protagonista fazendo
pesquisas e alertando a todos sobre eventuais ataques, que corria risco de vida
estando naquelas águas, sabia, portanto, que, possivelmente, não sairia vivo dessa
história. Mas o Phillips apresentado é um homem sóbrio, que mantêm em suas mãos
as rédeas da situação e não se deixa abalar. O longa é forte, não restam
dúvidas quanto a isso também, mas é necessário. Em entrevista à Carta Capital,
Greengrass revelou que “Pirataria nos oceanos é algo corriqueiro e preocupante
e tratar deste tema nos dias de hoje passa inevitavelmente por uma contemplação
da economia globalizada, da consolidação mundial da ideia de países, sociedades
e seres humanos ‘vencedores’ e ‘perdedores’”, digo mais: pirataria nos oceanos
é um assunto importante que deve ser lembrado sempre. Segundo ele, tudo foi
planejado de forma meticulosa: os quatro sequestradores foram recrutados pelo
diretor em Miniápolis, nos EUA, uma das principais comunidades somalis do país;
Tom Hanks, o protagonista, interagiu com eles apenas durante as filmagens, o
que tornou tudo mais real, pois todos estavam ansiosos e não sabiam o que um ou
o outro fariam. E deu certo. A composição do longa é magnífica. Não sou um
grande admirador de diretores que decidem utilizar câmera de mão, acho confuso
e parece mal feito, para falar a verdade, não gostava nenhum pouco dessa
alternativa. Até agora. A utilização da câmera na mão ou no ombro é o maior
trunfo de Greengrass, aproximando o espectador do contexto do filme e simulando
o balanço das embarcações em alto-mar.
Outros dois pontos importante a serem
lembrados são o roteiro do longa e a trilha sonora. Billy Ray tem um dos
melhores trabahos do ano em sua adaptação. Não tenho ideia de como seja o livro
escrito por Phillips, onde narra tudo o que lhe aconteceu, mas posso afirmar
que o que vemos no cinema é algo fantástico. Não só a história está coesa e
totalmente explicativa, como os diálogos são fortes e surpreendentes. A
primeira hora de filme se passa, praticamente, a bordo do navio cargueiro que
Phillips está comandando, e, ao contrário do que se possa pensar, não há nenhum
momento monótono. Aliás, Ray fez uma escolha ótima ao optar por não mostrar
muito da vida de Phillips ou dos outros envolvidos, incluindo os
sequestradores. Ray apenas sintetiza tudo, mostrando a vida dos tripulantes no
navio e revelando como todos os piratas somalis estão incluídos em um sistema
capitalista abominável. Mesmo assim, o roteiro não expõe os somalis como
vítimas, tudo fica bem claro do começo ao fim: Phillips, o americano é o herói,
os somalis, os africanos, são os vilões. A trilha sonora composta por Henry
Jackman se casa perfeitamente com o filme o tempo todo. Cada cena e sua música
se completam para criar climas de tensão, drama e suspense de forma
inacreditável. No desfecho do longa, quando Phillips está a salvo no navio
americano, o roteiro, o ator, o diretor e música nos apresentam umas das cenas
mais belas e tocantes que lembro de ter visto nos últimos anos.
Tom Hanks é o tipo de ator que conquista
o espectador em qualquer personagem. Só para citar dois de seus mais famosos,
lembro de Forrest Gump de “Forrest Gump: O Contador de Histórias” (1993) e
Chuck Noland, de “Náufrago” (2000). Recentemente, Hanks traz para o cinema o
gênio Walt Disney no longa “Walt nos Bastidores de Maty Poppins” (2013). O
Phillips apresentado por Hanks é um homem bom, gentil e honesto, como Capitão,
é um profissional sério, competente, honesto e centrado, como marido e pai, é
um homem família, que ama seus filhos e sua esposa. E é quando os piratas
chegam ao navio que Hanks mostra por que é um dos maiores atores de sua
geração, deixando transparecer toda sua força e sobriedade que se contrapõe com
o medo. Esse ano, a temporada de premiações vem forte com atuações masculinas e
femininas estupendas, e é um absurdo conferir uma atuação tão boa e tocante como
a de Hanks de fora da categoria de melhor ator no Oscar. Mas se Hanks foi
esnobado de forma inacreditável, o mesmo não ocorreu com Barkhad Abdi, que
interpreta Muse, o líder dos piratas. Ao lado de Hanks, esse iniciante segura a
onda representando o povo africano de forma lindíssima. Adbi mostra que Muse
faz o que faz por certa obrigação, mas que tem certo prazer em provar aos
outros o quanto pode ser bom em ganhar dinheiro. De forma geral, o restante da
equipe de atores segue a mesma linha de Hanks e Abdi, mas nenhum deles está tão
incrível que conseuiga ofuscar as belezas dos trabalhos desse gênios.
O longa possui indicações fortes ao
Oscar 2014, ao todo são seis. A mais importante, sem dúvida, é como melhor filme. Apesar de ser um dos
cinco melhores do ano, acabou perdendo espaço quando o diretor e o protagonista
foram deixados de lado em suas respectivas categorias. Em todo o caso, o prêmio
está entre “Gravidade” e “12 Anos de Escravidão”. Barkhad Abdi, nascido na
Somália, e em seu primeiro filme, leva a honra de ser indicado como melhor ator coadjuvante. Mesmo tendo
uma atuação poderosa e forte, o ator não tem chances contra Jared Leto, o certo
vitorioso do ano. Billy Ray acaba de se tornar o favorito na categoria de melhor roteiro adaptado após vencer o
prêmio do Sindicato dos Roteiristas. Mesmo concorrendo com “12 Anos de
Escravidão”, que considero um roteiro confuso e fraco, e com “O Lobo de Wall
Street”, um roteiro fabuloso, o filme tem grandes chances de levar o prêmio, e
será mais que merecido. No campo técnico, o longa vem muito bem representado e
com boas chances de levar algum prêmio. Como melhor edição do ano o filme está bem cotado e pode levar a
estatueta, concorrendo contra “Gravidade”, o favorito. Outras duas indicações
importantes e que podem ser arrebatas pelo longa, ameaçado por também “Gravidade”,
são melhor edição de som e melhor mixagem de som. A parte sonora
do filme é algo maravilhoso e pode ser vista como mais imponente que em
“Gravidade” se levarmos em consideração o fato de termos a perfeição em meio a
tantos sons diferentes, com vozes, música e efeitos. Não posso deixar de
lamentar a falta de indicações de Paul Greengrass como melhor direção, Tom
Hanks como melhor ator e Henry Jackman como melhor trilha sonora.
“Capitão Phillips” é, acima de tudo, uma
denúncia, um alerta sobre como a situação no Chifre da África está feia. E é
bom saber que alguém, finalmente, se preocupou em retratar tudo aquilo. É claro
que o longa também é uma produção patriótica, que exalta o poder dos EUA e a forma
como o país está preocupado em proteger seu povo. A rapidez com a qual
encontram Phillips e a forma honrosa com a qual o salvam provam isso.
Entretanto, uma coisa afirmo: se é preciso fazer um longa sobre a situação da
Somália apenas para exaltar o nacionalismo americano, já vale a pena. Aos que
gostam de criticar os EUA, digo apenas uma coisa: aproveitem a chance de ver uma
produção tão bem realizada que traz fatos reais e que precisam ser falados. É preciso,
ao assistir a esse filme, ter bom senso e ser inteligente o suficiente para
filtrar o nacionalismo exagerado. E volto, por fim, a bater na tecla sobre o
absurto de Greengrass e Hanks não estarem no Oscar, ao lado de Martin Scorsese
e Leonardo DiCaprio e Woody Allen e Cate Blanchett, também duplas
diretor-intérprete, e Meryl Streep e Julia Roberts e Sandra Bullock e George
Clooney, duplas de intérpretes, Hanks e Greengrass formam mais uma das grandes
duplas do ano. E afirmo mais: a única diferença entre Scorsese e DiCaprio e
Hanks e Greengrass é que estes não foram indicados ao Oscar.
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