O perigo de tentarmos encontrar a nós
mesmos está exatamente nessas descobertas a respeito de nossos próprios desejos, medos e anseios.
Nota: 9,5
Título Original: The Talented Mr. Ripley
Direção: Anthony Minghella
Elenco: Matt Damon, Gwyneth Paltrow,
Jude Law, Cate Blanchett, Philip Seymour Hoffman, James Rebhorn, Sergio Rubini,
Phiplip Baker Hall, Celia Weston, Fiorello, Stefania Rocca
Produção: William Horberg, Tom Sternberg
Roteiro: Anthony Minghella e Patricia
Highsmith (romance)
Ano: 1999
Duração: 139 min.
Gênero: Drama / Thriller / Crime
Quando Tom Ripley se passa por um
ex-colega de Dickie Greenleaf e é convidado pelo pai milionário do jovem para
tentar trazê-lo de volta para a América – Dickie cansou da vida de riquinho
vivendo com os pais e mudou-se para a Europa – o trambiqueiro vê sua chance de
conquistar o jovem e permanecer rico por muito tempo. Entretanto, quando Dickie
começa a enjoar da presença “grudenta” de Ripley é chegada a hora de escolher
entre o certo e o fácil, e Tom se verá em uma rede de mentiras e mortes
impossível de se escapar.
Patricia Highsmith se tornou uma
escritora famosa por suas histórias de thriller psicológicos, além de grandes
obras literárias, ela também escreveu contos, é óbvio que todos no mesmo tom
macabro, irônico e repletos do bom humor negro que todo mundo gosta. Para
Ripley ela reservou aquele tipo de história sobre a qual não podemos contar
muito, afinal, qualquer detalhe poderia estragar quase toda a diversão e a
intenção de surpreender o espectador. Após “O Paciente Inglês” (1996),
esperava-se que Minghella permanecesse em seu patamar (que é bem alto, por
sinal), e foi exatamente isso que aconteceu. Apesar de os dois filmes abordarem
temáticas totalmente diferentes, o estilo de Minghella permanece o mesmo:
sóbrio, objetivo, com tomadas amplas ou fechadas muito bem feitas e a
exploração maravilhosa de cada cenário. Além disso, a fotografia e a edição do
filme, bem como seu figurino – que surpreende mais ainda quando vemos a clara
mudança de Tom Ripley: do garoto pobre dos EUA, ao amigo do rico Dickie na
Europa – são obras a parte. A trilha sonora é do mesmo compositor de “O
Paciente Inglês” – que venceu o Oscar em 1997 pelo filme -, Gabriel Yared.
Obviamente, isso contribui ainda mais para as semelhanças entre os dois filmes,
mas, ainda assim “O Talentoso Ripley” é uma produção original que surpreende a
cada cena, mesmo sabendo o enredo todo da trama, cada ação de Ripley é imprevisível
e surpreendente.
Para viver o psicopata no cinema foi
escolhido Matt Damon, apesar de não gostar do ator em grande parte de seus
filmes, aqui ele está fantástico. Dentre as principais características de
Ripley, temos sua habilidade em imitar pessoas e assinaturas de forma quase
perfeita, entretanto, durante o filme, parece que a personagem acredita em suas
próprias mentiras, e Damon é tão fantástico que parece que ora ele está
manipulando Ripley, ora a personagem manipula seu intérprete; enfim, realizar
um trabalho tão maravilhoso ao interpretar um psicopata (que, para piorar,
acredita ser necessário matar esse ou aquele indivíduo) como Damon realiza, é
algo digno de ser assistido e admirado. Ao lado do ator está Jude Law como
Dickie, em uma de suas melhores interpretações, como um homem mimado que
resolveu sumir no mundo para tentar buscar algum sentido na vida, ao menos é
nisso que ele acredita, para mim Dickie é um ingrato notório, em suma, Law
também está ótimo, o que pode ser verificado em uma das melhores cenas do
filme, em que ele e Damon duelam em uma discussão que parece interminável – seu
desfecho é ótimo e só prova ainda mais a loucura de Ripley. Gwyneth Paltrow é a
namorada de Dickie, uma escritora que, apesar de inteligente, é um tanto chata
demais, daquele tipo de riquinha estressante e sem graça, apesar da personagem
ser dessa forma, Paltrow é mais uma surpresa ótima. Quem não é surpresa alguma
e só confirma seu talento é a dupla formada por Cate Blanchett e Philip Seymour
Hofman – os dois não tem nada a ver um com o outro e nem chegam a contracenar
juntos, que fique claro -, ela vive Meredith Logue, filha de pessoas ricas, a
jovem também tenta fugir da família, mas acaba caindo nas falsidades de Ripley
quando ele chega a Europa e diz a ela, para surpreendê-la e conquistá-la mais
rapidamente, que ele é Dickie Greenleaf, ela, inocentemente, acredita em tudo o
que ele fala, do começo ao fim; Hoffaman é o amigo de Dickie, Freddie Miles,
mais um bon vivant que vive sua vida como se não tivesse responsabilidade
alguma e acreditando que a é vida feita apenas dessas pequenas emoções, que ele
considera emoções inacreditáveis. Por fim, a última vítima de Ripley - um bom
homem que se apaixona por ele -, Peter Smith-Kingsley, interpretado por Jack
Davenport, mais um presente em um elenco tão bem composto, Peter é inocente,
iludido e apaixonado, mas comedido para não deixar transparecer tudo para uma
sociedade preconceituosa.
Apesar de Ripley ser o mais louco de
todos, deve-se destacar que não há uma personagem que seja nessa história que
não tenha vários problemas, e isso, por um simples motivo: todos aqui, sem
exceção, são personagens que interpretam personagens criadas por eles para a
vida ser algo menos irritante, monótona, sem graça, enfim, para viverem de
forma mais emocionante. O problema se concentra na intensidade com qeu isso se
faz presente, afinal, é normal inventarmos isso ou aquilo sobre nos mesmos e apenas
para nós mesmos para esquecermos um pouco os problemas do mundo, mas viver
dessa forma o tempo todo, sabendo que não somos aquilo que queremos que os
outros acreditem, é algo desumano. Sendo assim, “O Talentoso Ripley” explora o
íntimo do ser humano, encontrando os segredos mais obscuros de cada indivíduo,
retirando até a última pedra daquele porão onde todos acabamos escondendo
nossos segredos, dúvidas e medos. O problema está no exato momento em que a
porta desse esconderijo nada secreto é aberta, pois descobrimos coisas sobre
nós mesmos que jamais sabemos que existem, e até aspectos que não desejamos
descobrir. E é aí que mora o perigo.
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