A realidade brasileira revelada de forma
nua e crua em mais um grande filme nacional.
Nota: 9,5
Título Original: Linha de Passe
Direção: Walter Salles e Daniela Thomas
Elenco: Sandra Corveloni, João
Baldasserini, Vinícius de Oliveira, Geraldo Rodrigues, Kaique Jesus Santos,
Roberto Audi, Denise Weinberg, Ana Luiza Garritano, Sérgio Mastropasqua, Renata
Novaes, Mário César Camargo, Gabriela Rabello, Rafael Losso, Almir Barros
Produção: Mauricio Andrade Ramos, Walter
Salles, Daniela Thomas, Rebecca Yeldham
Roteiro: George Moura, Daniela Thomas,
Bráulio Mantovani
Ano: 2008
Duração: 113 min.
Gênero: Drama
Cleuza é uma empregada doméstica residente
do subúrbio de São Paulo que tem quatro filhos e está a espera de mais um.
Dênis já tem um filho e ganha a vida se arriscando nas ruas como motoboy para
tentar dar um futuro digno para sua família. Dario é um jovem de apenas 18 anos
que começa a se preocupar com sua idade pois deseja se tornar um jogador de
futebol. Dinho é um rapaz que já aprontou as suas, mas se tornou um garoto
religioso e entregou sua vida a Deus. Reginaldo, o mais novo, tem apenas uma
preocupação na vida: encontrar seu pai. Juntos, eles formam uma família
brasileira que luta por uma vida melhor e pela realização de seus sonhos.
Walter Salles e Daniela Thomas vem de
famílias ricas, tiveram excelente edução e conheceram a fama desde jovens.
Entretanto, isso não quer dizer que qualquer um dos dois comprometa esse filme,
que expõe a realidade de brasileiros pobres e sem oportunidade alguma. Muito
pelo contrário, a contextualização proporcionada pelo enredo exige que a dupla
apresente ao público um filme real, sem enrolação e que mexa no mais profundo
subconsciente de qualquer pessoa. E, satisfatoriamente, afirmo: eles obtêm
exito impressionante nessa tarefa. São Paulo é explorada, por eles, de forma
singular: mostram a boa vida da patroa de Cleuza, que, apesar de ser
trabalhadora, está longe de encontrar as dificuldades da empregada; mostra
alguns momentos dos cultos da igreja frequentada por Dinho e a dificuldade de
ser um “homem de Deus” em locais mais pobres devido ao preconceito; traz as
realidades das ruas de São Paulo quando Dênis dribla os carros e o tempo para
trabalhar; revela os problemas e as dificuldades de um jovem pobre em conseguir
entrar em um time de futebol para realizar o tão comum sonho de ser um jogador
de futebol no país do futebol; e revela algumas curiosidades sobre a busca de
um pequeno garoto atrás de seu pai.
Em meio a tudo isso, o roteiro nos
mostra a preocupação, o zelo e o orgulho que Cleuza tem de seus filho. Ainda
nesse contexto, vemos o respeito e o amor que esse quatro homens (e digo
homens, pois na situação em que essa família vive, até mesmo o pequeno
Reginaldo já teve de se tornar um homem) nutrem por sua mãe, mesmo com alguns
momentos de má criação. Em uma das cenas mais interessantes do longa, Dênis
segue dois rapazes que roubaram a bolsa de uma mulher e pega a bolsa do lixo
para presentear sua mãe. Apesar de ser algo errado, é bonito ver como um filho
deseja fazer a mãe feliz, o que mostra o reconhecimento pelos esforços de
Cleuza.
Sandra Corveloni arrebatou a todos no
Festival de Cannes de 2008 e levou o prêmio de melhor atriz por seu trabalho
como Cleuza. Não há como negar: o trabalho de Sandra merece todos os aplausos e
congratulações possíveis, afinal, poucas atrizes interpretam uma mãe com tanta
convicção e beleza quanto ela. E ainda não estou falando sobre a interpretação
de uma mulher de classe baixa, me refiro apenas à sua atuação como mãe, como
uma mulher que se vira como pode para criar os filhos. Sem restrições ou
comparações, Cleuza ama seus filhos e quer o melhor para eles, a dureza com a
qual Sandra apresenta sua personagem é só para lembrar que ela é mãe e pai
(como a própria personagem aponta em uma cena belíssima). Quanto ao lado
financeiro, Sandra nos mostra que uma mãe está aí para o que der e vier e que
apenas elas são capazes de dar suas vidas pelos filhos, não importa o que tenha
de ser feito, não importa os riscos vitais que elas corram.
Dênis é interpretado por João
Baldasserini, que nos apresenta um jovem emotivo que espera por algo melhor na
vida, que batalha para dar um futuro melhor a sua família. Ainda vemos, graças
a atuação de Baldasserini, a dificuldade em um jovem expor seus sentimentos e
assumir, definitivamente, a paternidade de seu filho. Por fim, ainda somos
expostos aos desejos e aos impulsos que apenas jovens possuem. Vinícius de
Oliveira é o jogador Dario, talvez o personagem que mais reflete o jovem
brasileiro de classe baixa que sabe que, de todas as maneiras possíveis, a
forma mais fácil e palpável de se conseguir dinheiro e fama é se tornar um
jogador de futebol, afinal, estamos no país movido por tal esporte. A beleza da
atuação de Vinícius está, justo, na forma como ele apresenta um garoto
determinado e esforçado. Aliás, o esforço e a determinação são qualidades
encontradas em todos os personagens desse longa, em Dinho, interpretado por
Geraldo Rodigues, são encontradas pela força de sua fé e de sua vontade de ser
um homem devoto e digno de receber o apoio divino. Rodrigues nos apresenta um
jovem que, provavelmente, já fez algumas besteiras na vida, mas se acaba por
ser como a marca do arrependimento. O jovem Reginaldo é interpretado de forma
maestral por Kaique Jesus Santos, que nos mostra um menino que possui um sonho
simples: encontrar seu pai biológico. O senho de Reginaldo é algo puro, simples
e extremamente natural. Ele representa uma parcela da sociedade da classe baixa
brasileira que acaba vivendo sem a presença do pai, seja por motivos naturais
ou não.
O quinteto formado por
Corveloni-Baldasserini-de’Oliveira-Rodrigues-Santos é um deleite para qualquer
cineasta ou para qualquer cinéfilo. Sem exceção, os cinco são extremamente
competentes e nos conquistam a cada frame do longa. Com o passar da história,
mesmo que agindo de forma errada, torcemos para que os personagens consigam o
que querem. Não que em algum momento algum deles represente o anti-herói que
Macunaíma representou no Modernismo, por exemplo, longe disso. Eles representam
a sociedade que, como vemos em “Cidade de Deus”, foi esquecida e deixada de
lado. São o povo, a massa de nosso país. Seres humanos como qualquer um de nós,
que lutam para sobreviver e visam um futuro mais digno e decente. Mas que, até
atingir tal futuro, não medem esforços para poder colocar o pão em cima da mesa
e não deixar que sua família seja dispersada. E talvez, esses deslizes e
desafios expostos, todos eles mostrados como acidentes necessários, ou seja,
erros impostos e não escolhidos pelos personagens, que fazem com que a família
se una de forma calorosa e amável. E é essa união que faz com que nos motivemos
e que nos apaixonemos por esses personagens, afinal, eles não são apenas eles, e
sim a representação de uma sociedade largada è própria sorte, nossa sociedade.
VENCEDORES DO PRÊMIO EUROPEU DE CINEMA:
Melhor
Filme: The Great Beauty / La Grande Bellezza
Melhor
Filme de Comédia: Love is All You Need / Den Skaldede Frisor
Melhor
Diretor: Paolo Sorrentino, por The Great Beauty
Melhor
Atriz: Veerle Vaetens, por The Broken Circle Breakdown
Melhor
Ator: Toni Servillo, por The Great Beauty
Melhor
Roteiro: François Ozon, In the House
Prêmio
Carlo Di Palma: Asaf Sudry
Melhor
Edição: Cristiano Travaglioli, por The Great Beauty
Melhor
Designer de Produção: Sarah Greenwood, por Anna Karenina
Melhor
Figurino: Paco Delgado, Blancanieves
Melhor
Composição: Ennio Morricone, por The Best Offer
Melhor
Designer de Som: Mat Muller e Erik Mishijew, por Paradise: Faith / Paradise:
Glaube
Melhor
Documentário: The Acr of Killing
Melhor
Filme de Animação: The Congress
Melhor
Filme Curta-Metragem: Death of a Shadow
Prêmios
Especiais: Ada Solomon, Catherine Deneuve e Pedro Almodóvar
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