quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

149. J. EDGAR, de Clint Eastwood


A interpretação da vida de uma das figuras mais poderosas e enigmáticas da história do EUA não poderia ser mais neutra.
Nota: 9,0


Título Original: J. Edgar
Direção: Clint Eastwood
Elenco: Leonardo DiCaprio, Armie Hammer, Naomi Watts, Judi Dench, Josh Hamilton, Geoff Pierson, Cheryl Lawson, David A. Cooper, Ed Westwick, Kelly Lester, Jack Donner
Produção: Clint Eastwood, Brian Grazer e Robert Lorenz
Roteiro: Dustin Lance Black
Ano: 2011
Duração: 137 min.
Gênero: Biografia / Drama

John Edgar Hoover nasceu no primeiro dia do ano de 1895. Aos 22 se formou em direito e foi trabalhar no Departamento de Justiça dos Estados Unidos (já havia criado um “banco de dados” para organizar a Biblioteca do Congresso Americano). Em seu primeiro trabalho importante no departamento, foi designado para investigar e terminar com as “farras” dos arruaceiros que dominavam o início da década de 1920. Em 1924, Hoover se tornou Diretor do Departamento, mas percebeu uma deficiência em relação as investigações serem demasiadamente fracas, para melhorar isso, criou o que conhecemos como o FBI atual. Durante os 48 anos de seu mandato, Hoover viu oito presidentes assumirem os EUA, desde Calvin Coolidge, até seu amigo Richard Nixon. John Edgar Hoover morreu em 1972, aos 77 anos de idade.


No filme, vemos praticamente toda a vida de Hoover, destacando-se o tempo em que esteve no comando do FBI. Durante quase toda sua vida profissional, duas pessoas estiveram ao seu lado: Helen Gandy, sua secretária e única amiga; e Clyde Tolson, o advogado com quem, supostamente, Hoover dividiu toda sua vida – sim, o Diretor do FBI foi suspeito de ser homossexual a vida toda. Além disso, temos a relação de Hoover com sua mãe, Annie, uma mulher que amava o filho, mas, acima de tudo, queria preservar sua imagem para que ele não perdesse sua posição social. Por fim, ainda assistimos a ascensão de Hoover e do FBI, com a perseguição de grandes bandidos da época, e sua “queda”, quando se tornou um peso para o Estado e começou a ser desinteressante para o presidente.


Conseguir a proeza de realizar uma produção sobre um homem tão controverso como Edgar Hoover, e permanecer neutro, sem julgar ou apontar apenas os erros de tal personagem, é uma tarefa árdua e que só poderia ser feita com tamanha perfeição por um diretor: Clint Eastwood. Os motivos para toda essa dificuldade são claros: Hoover era homossexual (ao menos é o que o filme mostra, que fique claro; com toda a naturalidade e respeito do mundo), o que, para a época e devido a sua posição no FBI, era algo inaceitável; ele era maçom, o que já o torna suspeito de diversas coisas; ele guardou arquivos confidencias sobre todos os presidentes, pessoas relacionadas a eles e outras figuras importantes que surgiram nos EUA durante a época em que comandou o Departamento; lutou contra Martin Luther King e, como sua mãe, teve preconceito durante anos; não admitia ninguém que não fosse no mínimo perfeito para ingressar em seus grupos de investigação e permaneceu solteiro toda a vida. Escrevendo essa crítica já me sinto julgando o homem, imagine fazer um filme de aproximadamente duas horas sem cair no mesmo erro. Pois bem, Eastwood consegue, e, ainda por cima, se aventura compondo a trilha sonora do longa. Apesar da beleza da fotografia do filme, do figurino, da edição, do som e do roteiro que tinha tudo para ser mais que monótono, existe um problema terrível (literalmente) no longa, sobre o qual não posso me dar ao luxo de deixar de falar: a maquiagem de  um grupo imenso de profissionais. Não há como explicar o quanto a caracterização de Leonardo DiCaprio ficou semelhante ao próprio Hoover, mas parece que colocaram nele uma máscara que, enquanto secava, ficou toda rachada, pior ainda é quando vemos, pela primeira vez, Armie Hammer caracterizado como o Tolson idoso.


Apesar da maquiagem péssima, entretanto, a atuação de DiCaprio, tanto no Hoover jovem, quanto no idoso, ou em qualquer idade, faz com que quase esqueçamos das imperfeições da equipe técnica, não que essa seja a melhor atuação do ator, mas é, sem dúvida alguma, ótima, pois ele nos trás os trejeitos da personagem e consegue ser ora o homem forte e inexpugnável, ora o velhinho indefeso e confuso sobre tudo o que realizou em sua vida. Armie Hammer demonstrou, desde “A Rede Social”, onde viveu os gêmeos Winflevoss, que é um dos melhores atores de sua idade hoje, como Tolson ele é o único da dupla que aceita a homossexualidade e tenta lutar pelo amor das personagens, mas sem deixar com que os outros vejam sua opção de forma totalmente nítida, e é nessa tentativa e na necessidade de Tolson permanecer sempre ao lado do homem que ama, que Hammer tem, mais uma vez, um triunfo como coadjuvante – espero por um papel de nível de protagonista para ver se ele terá o mesmo desempenho. Para fechar o trio, está Naomi Watts, em uma interpretação pra lá de surpreendente da secretária Helen Gandy, uma mulher disposta a deixar a vida de lado e seguir em frente para ter o sucesso profissional que acha digno de qualquer ser do sexo feminino, em uma das melhores cenas do filme, ela recebe a notícia da morte de Hoover, tranca o escritório e, antes mesmo de fazer qualquer ligação, destrói todos os arquivos confidenciais sobre os presidentes e as personalidades (isso tudo atendendo a um pedido do amigo e chefe de uma vida). Por fim, a atuação de Judi Dench é, como qualquer outra interpretação da atriz, um assombro, ela é firme e não deixa todos os seus sentimentos transparecerem - curiosamente, essa personagem tem muito da M feita por Dench na franquia 007, o que não significa, absolutamente, que a atriz faça algo se quer parecido nesse filme, muito pelo contrário, provando, mais uma vez, sua habilidade incomparável de encarar qualquer personagem, mesmo no auge de seu 78 anos.


Mais uma vez, além da confirmação de que Judi Dench é perfeita em qualquer papel que ela aceitar, temos a confirmação de que não importa o que seja dado a ele, sendo Clint Eastwood, jamais será menos que ótimo. Além disso, como já apontei, Eastwood consegue ser imparcial de uma forma inacreditável, sem julgar ou apontar os problemas acerca de Hoover, um homem imprevisível que jamais deixou as características que formaram sua identidade se tornarem proeminentes, sendo um homem reservado e muito conservador (apesar da sexualidade). Além da maquiagem, entretanto, parece que falta alguma coisinha essencial nessa produção, aquele tipo de coisa que não conseguimos identificar, sendo assim, nos resta a conformidade de que amamos tudo o que Eastwood faz e rever o filme para tentar encontrar o problema, e, tentar, mesmo que em vão, compreender a mente de John Edgar Hoover.

NA ESQUERDA, OS VERDADEIROS HOOVER E TOLSON.
 NA DIREITA, A ESPANTOSA (NO SENTIDO LITERAL DA PALAVRA) CARACTERIZAÇÃO DOS ATORES.

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